Mestre de coco e embolada perdeu a onda do manguebeat e amargou 15 anos de ostracismo depois de dois anos de prisão; agora dá a volta por cima
André Dib // andredib.pe@dabr.com.br
André Dib // andredib.pe@dabr.com.br
Nos anos 90, no bojo do movimento manguebeat, a cultura popular passou a ser item de consumo de uma classe média que até então a considerava mero folclore. Artistas de longa data como Mestre Salu e Selma do Coco foram diretamente beneficiados por esse upgrade conceitual, que os elevou à categoria de estrelas pop. Entre os que lamentam não ter vivido esse momento está Galo Preto. Mestre do coco de embolada, enquanto muitos surfavam na efervescência cultural daquela época, ele amargava as consequências de ter passado dois anos atrás das grades. Após 15 anos de ostracismo, o embolador de 74 anos quer retomar a carreira que um dia o levou a programas de rádio e TV (entre eles, programas do Chacrinha, Flávio Cavalcanti e Silvio Santos) e vários estados do país.
Nos anos 70, durante o governo Heraldo Gueiros Leite, Galo Preto foi a Brasília ao lado de Luiz Gonzaga e Lourival Batista, participar da Festa da Bandeira. Em 14 de outubro 1979, o Diario de Pernambuco publicou matéria de página inteira, assinada por Lêda Rivas, que apresentou Galo Preto como "um dos maiores repentistas deste Nordeste de poetas".
Mas a história profissional de Tomás Aquino Leão Cavalcanti - o apelido Galo Preto, obtido pela valentia ao apartar uma briga, ainda estava por vir - começou bem antes, aos 12 anos, numa tarde de 1947, quando o poeta Ascenso Ferreira percebeu o talento do jovem garoto recém-chegado de Bom Conselho, Agreste do estado. "Meu irmão se mudou para Campo Grande, no Recife e eu fui com ele", conta Galo. "Eu gostava de música e futebol, e ele dizia que isso era coisa pra vagabundo e me botou pra vender fruta. Todo dia eu passava cantando na frente da casa de Ascenso. Um dia ele me deu o cartão de Zil Matos, que tinha um programa na Rádio Clube". Na rádio, Galo Preto cantou sua primeira composição, A pinta, que fez quando tinha nove anos.
Galo Preto conquistou a audiência, primeiro ao lado do irmão Curió, de quem se separou para fazer uma turnê como parte do cast da Rádio Clube e sofreu o primeiro revés. O radialista responsável pelos shows, Zé Renato, nunca pagou o cachê. De volta ao Recife, se apresentava em festas, bares e casas de família. "Tocava para os Queiroz, os Monteiro, os Coelho. Uma vez, num hotel, fui apresentado a Milton Lundgren, diretor das Casas Paulista, que me chamou para inaugurar uma loja, depois outra. Quando vi, já tinha viajado para oito estados".
A evidente criatividade para a criação de jingles o levou a participar de campanhas políticas. "Já trabalhei para Ney Maranhão, Paulo Guerra, Miguel Arraes. Na minha banda, mantinha como contratados Arlindo dos Oito Baixos, Novinho da Paraíba e Arlindo Moita". O episódio que culminou na sua prisão ocorreu justamente ao participar de uma disputa eleitoral, em 1992, quando foi acusado de liderar um grupo de extermínio em Peixinhos. "Passei dois anos, dois meses e seis dias preso por causa de uma mentira. Não tinham prova nenhuma, nem testemunha. Por que fiquei esse tempo todo preso?" Quando foi liberado por falta de provas, sua reputação no meio artístico já estava manchada. "Ninguém me procurou pra nada, todos acreditaram na mentira. Fiquei com nojo e parei com tudo".
Galo Preto não é o primeiro artista popular a cair no ostracismo após temporada atrás das grades. Há pouco tempo, Zé Neguinho do Coco amargou situação parecida. Para seu produtor, Alexandre L'Omi L'Odò, a prisão indevida de Galo Preto foi caso de racismo. "Ele só sofreu isso porque é negro", garante. "O que as pessoas não sabem é que ele é o último representante vivo do coco do quilombo Santa Isabel, em Bom Conselho, que domina o coco e a poesia de repente", afirma L'Omi, que pretende gravar um álbum com o mestre, publicar um livro com sua história e pleiteiar a Galo Preto o título de Patrimônio Vivo de Pernambuco.
O isolamento do embolador foi rompido pela primeira vez em 2007, quando ele participou do projeto Coquistas contra a violência, promovido pela Secretaria de Saúde de Olinda. Wilson Freire, que registrou o projeto em vídeo, encontrou em Galo um bom personageme produziu o documentário O menestrel do coco, ainda sem data de lançamento.
O projeto gerou o único registro fonográfico de Galo Preto em 65 anos de carreira e o colocou ao lado de Dona Selma, Aurinha do Coco, Beth de Oxum, Zeca do Rolete, entre outros. Seu primeiro grande show foi na festa de três anos do programa Sopa Diário, onde tocou no mesmo palco que Mundo Livre e Lula Queiroga. Desde então, ele se apresentou na Festa da Lavadeira, Festival de Garanhuns e Pre AMP. Em agosto, foi destaque na Feira da Música de Fortaleza, onde foi selecionado entre mais de 600 artistas brasileiros inscritos. A mais nova conquista surgiu esta semana, quando foi escolhido para integrar a programação off-Feira Música Brasil / Conexão Vivo, no próximo sábado, na Torre Malakoff.
___________________
Publico aqui, matéria do Diário de Pernambuco com o Mestre Galo Preto Edição de terça-feira, 8 de dezembro de 2009. Ele foi capa do caderno VIVER, e em vésperas de seu esperado show na Conexão Vivo, no circuito OFF Feira da Música, revelou pela primeira vez sua história de prisão para mídia. Estando próximo do lançamento de seu filme: "Galo Preto, o menestrel do coco", do cienasta Wilson Freire, no início de 2010, ainda guarda surpresas que só serão reveladas na película de 49 minutos.
Façam boa leitura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário