Símbolo do infinito, a Lemniscata é uma bela alegoria para ilustrar o significado do carnaval cíclico de Pernambuco. Imagem do google.com
Carnaval Lemniscatiano!
Carnaval Lemniscatiano!
O Carnaval de Recife/Olinda, na verdade é um contínuo freqüente de auto-realização e produção durante os anos. As cidades, se revestem de luz e cores apenas para fortalecer mais ainda a intensidade daquilo que a circula o ano todo, no período oficial do Carnaval...
Quem passeia pelas ruelas que compõem o bairro de São José, poderá sentir na pele, com muita intensidade a força que é o comércio do Carnaval para Pernambuco como um todo. Todos os dias, antes ou depois do ciclo festivo de Momo, estas ruas são passarelas para os “estilistas” carnavalescos transitarem com inúmeras sacolas com tecidos, lamês, penas diversas e inúmeros outros utensílios que sempre ditam o futuro multicor do Carnaval vindouro.
As pessoas aqui encaram com tranqüilidade este movimento incessante que reveste a localidade de mistério, alegria e muita curiosidade.
Quase não se ouve o frevo nas rádios ou nas ruas... O som é sempre o que está na moda no momento, principalmente divulgados pelos famigerados carrinhos de CD pirata que circulam todo o centro do Recife e comunidades ao redor ditando o som do momento, ou a música famosa. Isso ainda mudou a forma como a cultura de massa se manipula. Hoje não mais as rádios, detentoras do jabá das ex-grandes gravadoras, mas sim um grupo de contraventores que de forma inconsciente, acredito, fazem o povo vibrar ao som ditado pela preferência das maiorias das comunidades que compõem o Grande Recife e Região Metropolitana. Isso, ao observar, parece-me algo revolucionário, mesmo que uma revolução pouco percebida por todos, mas é um paradigma que este povo está quebrando de forma interessante e inquietante. Mas, contudo, o frevo só volta às ruas nos meses que compões o Carnaval pernambucano. Aqui, a partir de novembro, “já é Carnaval”. Olinda, cidade detentora da alma da brincadeira, já inicia seus ensaios abertos de blocos e festas pré-carnavalescas. Isso muda sim as pessoas. O clima quente do sol das Cidades se inflama mais ainda com o compasso sincopado do bombo de frevo e a forte pisada da dança que faz ferver.
Em Olinda, adolescentes são todos fortes... Preparados pelo tempero da terra, pelo sabor da cultura das ladeiras velhas e do colorido brilhante do sempre interminável e vindouro Carnaval. Este ciclo (carnaval lemniscatioso) é o símbolo mais forte dos nativos. Aqui é festa na alma. Se a teoria kardecista da reencarnação for verdadeira, ela se prova nestas terras. Aqui pais e filhos mantém as mesmas tradições a vida toda e sem medo de serem felizes. Se jogam na alegria de viver, na concorrência leal das agremiações, nas lutas quase feudais dos maracatus, na farra da cerveja, pitu, e jurubeba. Isso tudo, ainda sem sequer dar valor ao desprezo histórico e a dívida secular que o Estado brasileiro tem com todos estes brincantes, que de forma sábia, driblam a depressiva consciência do descaso humano fomentado pelos governos com força e emoção, colocando nas ruas a única coisa que realmente importa na vida, a própria vida, plena em alegria. Este é um contra movimento. Contra a desgraceira brasileira. É melhor ser feliz em Recife e Olinda, e viver bem, com a consciência ancestral da luta pela preservação dos valores que realmente fazem sentido para todos, do que apenas consumir-se com a inegociável demanda da bandalheira política. Mas ainda, percebe-se que o carnaval é crítica só. “É pau no lombo dos safados”. Com irreverência, dá pra ver o quanto também se preocupa com as deficiências que nos consomem... Tudo sem perder a alegria, que é o traço mais marcante do povo dessa terra.
Os sulistas, nunca nos entendem... Ficam passeando pelas ruas achando que somos todos loucos e inconseqüentes, ou que somos maravilhosos por termos a cultura que temos... Sempre com aqueles olhares que desfilam dúvida e admiração sacana.
Nas pontes, nos dias de festa, observa-se esta alma capenga passeando pela cidade. Nunca conseguem acompanhar o ritmo frenético dos grupos de brinquedo. Ou vêm com desejo de nos levar a lama, ou vêm com desejo de se sentirem como nós, nativos nordestinos... Queimadinhos e bonitinhos, filhos do Deus Há, o sol, estrela que dá queimaduras de primeira grau em todos os brancos que se deliciam com o sal do mar e o doce dos rios nestas terras.
Estas cidades em si, resguardam segredos impossíveis de codificar. Aqui tem mais mistérios por metro quadrado que em um jogo de tarô em seus arcanos maiores e menores, todos eles medievais. Médios, antigos, primitivos, índios, negros... Aqui é a terra do segredo que não dá trégua. Isso se prova com nossa força em fazer mais de cinco meses de festa, que se estende ainda por um São João rico de milho e forró, e por um ciclo natalino com mais cores e alegrias ainda desfilando quase um carnaval cristão pelos pátios e palcos...
Enfim, a cultura da terra leonina é a maior do mundo, a melhor do mundo, a mais mais do mundo, pois se não for assim, não presta e se refaz tudo de novo só pra provar que os filhos do Leão, são mais que descendentes do sol, são descendentes diretos de tudo que é mais e maior... Deus e Deusa? Assim é o povo destas terras quase gêmeas, que olham uma para a outra de forma a domesticarem-se uma a outra aos vis desejos naturais da doutrina pernambucalhana. Olhem o povo. Né?
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Este artigo foi apresentado como trabalho extra-classe na cadeira de História Urbana. Fugi da proposta sugerida pela professora Beatriz Brustantin, mas tive que fazer aquilo que sempre me ordena interiormente. A academia, espero, nunca haverá de me conspurcar ideologicamente. Boa leitura.
Alexandre L’Omi L’Odò
História - UNICAP.
Um comentário:
L'Omi, muito bom o trabalho. Uma leitura não muito convencional que a academia faz. Eu também em tempo de minha graduação tentei fugir do enquadramento que propunham alguns professores, mas precisei recuar senão não me formaria rsrsrs. Mas acredito esse ser nosso diferencial que ficará para sempre na História de Pernambuco. Graças à grande invenção da Internet. Parabéns, revolucionário L'Omi. axé e paz irmão.
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