sábado, 12 de outubro de 2013

Um dia para celebrar a Jurema - Matéria sobre o Kipupa Malunguinho no Jornal do Commercio de 21 de setembro de 2013

Fotografia editada da matéria do Jornal do Commercio de 21 de setembro de 2013 - Sábado. Caderno C 3.

Um dia para celebrar a Jurema

Bruna Cabral

Antes dos gajos, das sinhazinhas, do açúcar e da lavoura. Bem antes do tronco da senzala e da escravidão. Quando ainda não era quintal de ninguém e nem sonhava em ser nação um dia, o Brasil já tinha credo. Os índios, legítimos primeiros habitantes de nossa generosa geografia, cultivaram desde sempre uma liturgia verde, que se valia de frutas, ervas, cipós e tudo mais que a natureza tinha a oferecer para mantê-los em contato com o sagrado. Defendida com unhas e dentes até hoje, a Jurema, garantem seus poucos, mas fervorosos seguidores, foi a primeira religião do Brasil. A matriz do que aprendemos a chamar de fé neste País de tantas crenças que se acomodam ou acotovelam do Oiapoque ao Chuí.

Amanhã, essa tradição indígena será celebrada com fartura, música e devoção. A festa vai acontecer na Mata do Catucá, em Abreu e Lima, durante todo o dia. Batizado de Kipupa Malunguinho, o evento está em sua oitava edição e reunirá juremeiros do Brasil inteiro – homens e mulheres, crianças e velhos. Todos com a roupa tradicional da jurema: eles de calça, camisa e chapéu, e elas de saia colorida e torso na cabeça. Todo o roteiro destina-se a lembrar a vida dos índios e negros que se juntaram na fé e na labuta, nas matas do Engenho Pitanga II, bem naquelas imediações onde acontece a celebração. “Homenageamos, acima de tudo, Malunguinho, líder que se elevou à divindade na jurema sagrada. Iremos à mata para louvar e honrar nossos ancestrais”, diz Alexandre L’Omi L’Odò, estudante de história, discípulo e porta-voz da religião.

Além de oferendas em agradecimento a questões resolvidas, os filhos da Jurema levarão seus cachimbos, maracás, ilus e pandeiros para festejar. Música não haverá de faltar. Estão programadas apresentações do Coco dos Pretos, Grupo Bongar, Mestre Zeca do Rolete, entre outros. Para preservar a mata, o uso de velas será proibido. E todo o lixo produzido durante o evento será devidamente recolhido pelos juremeiros. “A mata é nosso espaço mítico. Nosso templo. Temos um respeito enorme por ela”.

E nem poderia ser diferente. Segundo Alexandre, a prática espiritual, restrita ao Norte e, principalmente ao Nordeste do País, carrega a alcunha de uma planta da família das acácias. Raízes da árvore são maceradas e misturadas a outras ervas para compor uma bebida, com efeito alucinógeno, utilizada por iniciantes e iniciados na religião – em diferentes concentrações, claro. “É o que chamamos de ciência da jurema”, explica Alexandre. A bebida, segundo ele, conduz às chamadas “cidades encantadas” da jurema, onde cada um, devidamente guiado e acompanhado por um mestre, tem determinadas revelações. “Ninguém volta igual dessa experiência”, diz.

Por isso mesmo, Alexandre e todos os entendidos da jurema costumam dizer que sua principal liturgia e seu maior dogma é a liberdade. Em seus templos ou em suas casas espalhados por todo o Estado, os filhos da religião são sempre bem-vindos. De manhã, à tarde, durante a noite ou no meio da madrugada. “Cada um tem uma necessidade específica. Às vezes, urgente. Então, procuramos orientação dos mestres para resolver cada questão”, explica Alexandre. Segundo ele, todo conhecimento dos indígenas sobre ervas terapêuticas foi preservado pelos seguidores da religião e é utilizado sempre que necessário. Mas, quando o mal é da alma, o que a jurema tem a oferecer é amparo e orientação. “Nunca fomos proselitistas. Não queremos audiência, nem confetes. Só respeito.”

A quem interessar possa, ônibus sairão do Carmo, a partir das 7h, para fazer o traslado dos participantes. O valor individual é R$ 15. Informações: 81 8887-1496 ou no www.qcmalunguinho.blogspot.com   

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Publico aqui matéria integral do Jornal do Commercio de 21 de setembro de 2013, Caderno C 3. Esta foi a primeira matéria de jornal conseguida para o evento nestes oito anos de atividades. Estamos avançando e querendo ir mais longe, contribuindo para que o povo da Jurema tenha espaço digno para sua história e religião. Salve a fumaça!


Alexandre L'Omi L'Odò
Quilombo Cultural Malunguinho
Rede Nacional do Povo da Jurema
alexandrelomilodo@gmail.com 

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

VIII Kipupa Malunguinho - Triunfando na Jurema! Agradecimentos

VIII Kipupa Malunguinho (altar) - Foto de Juliana Düb.

VIII Kipupa Malunguinho
Triunfando na Jurema!

Agradecimentos

Mais um ano realizamos o Kipupa Malunguinho, Coco na mata do Catucá com êxito e alegria. Já na VIII edição, continuamos com nossa missão de fortalecer o Povo da Jurema em sua completude, tanto teológica quanto de representação política na sociedade, contribuindo para o levante da auto-estima destes, para que possam se afirmar como juremeiros e juremeiras, colocando a Jurema em um lugar mais decente perante sua história e contribuição para as demais religiões que posteriormente chegaram ao Brasil.

O Kipupa, mais uma vez reafirmo, não é uma “festa nas matas”, ou um “piquenique de Jurema”, ou até mesmo uma “caminhada de Malunguinho”. O Kipupa é o maior encontro de troca de saberes entre juremeiros e juremeiras que existe até hoje no país, evento que traz pessoas de toda parte do Brasil para conhecer um espaço histórico na luta do Povo negro e indígena de Pernambuco, também, para conhecer a história de Malunguinho e vivenciar uma experiência profunda com a ciência da Jurema Sagrada e com os saberes da cultura popular e tradicional em matas sagradas e consagradas à seu Reis e demais entidades e divindades. Também, é um grande ato de fé coletivo consciente, não devemos esquecer... Este momento também faz parte de um calendário já tradicional para nosso Povo, pois setembro já é o mês de Malunguinho para muitos terreiros que entenderam o papel de reconhecer nossas divindades com a dignidade que elas merecem nos rituais internos e na vida cotidiana, afinal, Malunguinho também é um herói de nosso povo, e assim devemos celebrá-lo.

Realizar um evento deste porte não é fácil... Muito trabalho, muita luta, meses de idas e vindas em secretarias, salas, conversando com pessoas, pedindo ajuda, realizando reuniões, correndo e correndo para garantir o melhor em estrutura e condições pra nosso povo se sentir a vontade pra poder juntos expressar o que de melhor temos em nós: nossa ciência.

Assim é o Kipupa Malunguinho, evento que cresceu junto com a consciência do povo da Jurema para construir novos rumos para nossa religião, tendo como referência o herói Malunguinho, guerreiro do Catucá que até hoje nos protege e orienta, cumprindo seu papel histórico e divino.

Temos que agradecer muito a todas e todos que ajudaram o evento a acontecer, pois sem estes não poderíamos ter o realizado, claro (rsrsrs). O evento ainda não tem a estrutura que merece, nem o reconhecimento por parte do poder público local e estadual que almejamos, mas estamos na luta, às vezes até nos humilhando por apoio... Esta fase um dia há de passar, pois creio que as entidades não estão cegas e insensíveis a toda essa luta que travamos pelo nosso povo e por eles também, a final, entendemos tudo isso como uma missão, uma missão cara, difícil, pesada, nada confortável, mas válida e necessária para podermos inverter nosso lugar de exclusão que ainda vivemos. Portanto, lutar foi nossa escolha. Não queremos ficar dentro de nossas casas apenas soltando fumaça pra ajudar “freguês” ou filhos, queremos soltar nossa fumaça pra mudar um paradigma social histórico de exclusão e racismo a que todos nós estamos submetidos indesejadamente, e por isso damos nossa cara à tapa.

Gira com o povo da Jurema no VIII Kipupa Malunguinho. Foto de Rennan Peixe.

Obrigado a Malunguinho por mais um ano de vitórias e agregação de pessoas em prol dessa luta. Obrigado a ciência mestra da Jurema Sagrada que nos permite realizar este evento. Obrigado a Tupã pela nossa existência e força vital. Obrigado a toda equipe do Quilombo Cultural Malunguinho, e a todas e todos que ajudaram mesmo sem pertencer ao QCM oficialmente; Obrigado aos apoios de: Mãe Graça de Xangô pela ajuda imprescindível na vendagem das camisas “A JUREMA MERECE RESPEITO”; obrigado a Pai Messias por ter organizado seu terreiro para contribuir com o evento; Obrigado a Pai Tonho de cajueiro Seco por mais um ano estar conosco; Obrigado a Vado Juremeiro por ter se disponibilizado a organizar o ônibus da Vila das Lavadeiras; Obrigado a Ana de Oyá por ter ajudado a vender uma parte das camisas; Obrigado a todas e todos que compraram as camisas (esta grana ajudou demais ao evento se realizar). Obrigado ao secretário de Estado Oscar Paes Barreto, a Isaltino Nascimento, ao vereador do Recife Vicente André Gomes, ao vereador do Recife Raul Julgmann; obrigado a Prefeitura de Abreu e Lima na pessoa de Wellington Tiago – secretário de Turismo e Cultura do município; obrigado a Amauri Cunha coordenador do Núcleo Afro da Prefeitura do Recife; Obrigado a prefeitura do Recife pelas águas enviadas; obrigado a prefeitura de Olinda através da secretaria executiva da Mulher comandada por Donana Cavalcanti; obrigado à Rita Honotório e sua irmã Juliene pelos fogos doados; obrigado a Juliana Bison por ter se disponibilizado a organizar o ônibus de Peixinhos; Obrigado a Anne Cleide por ter se disponibilizado a ajudar nos ônibus do centro do Recife; obrigado a Graça Bastos; obrigado a Eric Assumpção pela ajuda decisiva para a realização do evento em loco; obrigado a Vivi e a Wilson Maraca pela ajuda imprescindível em toda estrutura do evento um dia antes e no dia, inclusive no esvaziamento dos buracos de lama a balde; Obrigado a Jorginho meu filho que com sua luz me ajudou a suplantar as dificuldades; obrigado a Arthur Lima pela decoração e ajuda em geral que deu; obrigado à Kamilla da Costa pela contribuição efetiva ao evento e na ajuda que deu durante o dia do mesmo; Obrigado como sempre à Juarez e a Nani que sempre nos ajudam muito neste processo; Obrigado a Eliane do Mercado de São José, da Casa Abre Gira por nos ajudar a vender os bilhetes dos ônibus; Obrigado ao SAMU pela cobertura com uma ambulância no local; obrigado à Polícia Militar de Pernambuco nas pessoas da capitã Lucia Helena do GT Racismo da Polícia e do Capitão André Luan; Obrigado ao terreiro Mensageiros da Fé, casa que sustenta os fundamentos de Malunguinho através de Sandro de Jucá e Dona Dora (meus padrinhos); obrigado ao Ministério da Saúde por ter enviado o professor Jayro Pereira de Jesus, e obrigado ao professor por ter vindo do RS dar o curso de Afrobioética na Semana da Vivência e Prática da Cultura Afro Pernambucana e por ter participado do Kipupa com uma fala importante; Obrigado à professora Célia Cabral e a Escola Estadual Mariano Teixeira por terem realizado mais um ano a Semana de Malunguinho (Lei estadual 13.298/07); Obrigado à Alexandre Miranda pelo apoio dado; Obrigado à deputada estadual Tereza Leitão e seu assessor Félix Aureliano pelo apoio dado; Obrigado ao CEPIR e ao Governo do Estado pelo fundamental apoio dado; obrigado a Diego, motorista que me conduziu cruzando toda cidade entre dos dias 18 a 22 de setembro de 2013 – sua sensibilidade e harmonia ajudou muito a tudo dar certo; Obrigado à Nino do Bojo da Macaíba pela confecção de todas as artes usadas no evento; E um obrigado muito especial aos grupos culturais que fizeram a festa vibrar com seus cocos – Coco de Roda Bojo da Macaíba, Coco dos Pretos, Grupo Bongar, Mestre Zé Negão e ao pessoal da LAIA e ao mestre Zeca do Rolete. Ainda, agradeço a todas e todos que esqueci de colocar aqui (reinvidiquem se necessário que coloco – rsrs).

Mesmo tendo levado uns NÃO’S de instituições nacionais de Brasília que deveriam nos ajudar, o evento aconteceu, isso se deve a muita luta.

No meio de todo este processo, ainda pudemos fortalecer mais ainda a Rede Nacional do Povo da Jurema através da grande adesão por parte dos juremeiros e juremeiras e outros presentes que assinaram a ficha de adesão oficial da Rede. Em breve vem novidade por ai do nosso Povo, aguardem...

O IX Kipupa vem ai... Vamos preparar os cachimbos que a pisada vai ser forte! Simbora Povo da Jurema, buscar nosso lugar! Salve a fumaça!!!

Sobô Nirê Reis Malunguinho!
Salve a Jurema Sagrada!

Alexandre L’Omi L’Odò
Quilombo Cultural Malunguinho
Rede Nacional do Povo da Jurema

Quilombo Cultural Malunguinho

Quilombo Cultural Malunguinho
Entidade cultural da resistência negra pernambucana, luta e educação através da religião negra e indígena e da cultura afro-brasileira!