domingo, 24 de fevereiro de 2019

Bloco dos Catimbozeiros, evocando o respeito à diversidade religiosa nas ladeiras de Olinda

Estandarte oficial do Bloco dos Catimbozeiros. Saída dia 04/03 (segunda de carnaval, ao meio dia do Largo do Amparo.

Bloco dos Catimbozeiros
Release

Bloco fundado por Alexandre L’Omi L’Odò, sacerdote juremeiro da Casa das Matas do Reis Malunguinho em 2019. Esse bloco tem a pretensão de ser uma das vozes do povo de terreiro no Carnaval de Pernambuco. A tradição da Jurema e do candomblé tem como uma de suas importantes práticas os rituais preparatórios para o carnaval, sendo assim, todas as manifestações de cultura popular que estejam ligadas ao sagrado afroindígena, cumprem um severo ritual comprometido com as entidades e divindades dos panteões religiosos dessas duas tradições. Esses ritos pedem proteção, paz, segurança, livramento de tudo que é de ruim nos dias de Momo. Então, temos nas ruas, abertamente, contatos com símbolos e objetos sagrados, preparados para cumprir a missão de defesa e prosperidade para os blocos, agremiações, maracatus, afoxés, bois, la ursas, etc.

O catimbó, em termos gerais, é a mesma coisa que a Jurema Sagrada, uma religião de matriz indígena do Nordeste do Brasil, que está presente em todo estado de Pernambuco, sendo em Recife e Região Metropolitana, a religião mais presente nos terreiros, sendo mais de 70% das casas, como aponta o senso realizado em 2010 pelo MDS e UNESCO. Esse termo, é profundamente estigmatizado na nossa sociedade, sempre ligado à coisas ruins, ao mal e à bruxaria. Não há consenso teórico que determine o significado desse termo indígena, contudo, o povo de terreiro sabe que catimbó é o ato de fumar cachimbo, ou o próprio cachimbo, elemento fundamental no culto da Jurema.

Para mudar a lógica de que nós somos o mal e educar nossa sociedade racista, o Bloco dos Catimbozeiros vai às ruas para levar alegria, fumaça, fé e proteção para o carnaval. Com muito catimbó, coco, maracatu e a presença ilustre do Calunga Gigante do Reis Malunguinho, as ladeiras de Olinda vão ser sacralizadas com todo axé e ciência do povo de terreiro, que tem em sua tradição, praticar o bem coletivo e curar os males de quem precisar.

A idéia é simples. Nos reunirmos em frente a Casa das Matas do Reis Malunguinho, todas e todos que são de terreiro, levando algum elemento religioso ligado à Jurema, como cachimbos, maracás, etc. Usar as roupas tradicionais e sair às ruas levando a bandeira da paz e da luta contra toda forma de racismo religioso. No meio deste contexto, depois de cumprimos nossas obrigações nas ladeiras de Olinda, claro que celebraremos sambando muito coco de roda, maracatu, mazurca e tudo mais que faz parte da tradição de terreiro, em frente à Casa das Matas do Reis Malunguinho.

Serviço:

Saída dia 4 de Março ao meio dia em ponto. O bloco será acompanhado pelo Maracatu Nação do Reis Malunguinho e o Calunga Gigante do Reis Malunguinho, ambos estreando nas ladeiras de Olinda.

Local: Casa das Matas do Reis Malunguinho - Rua de São João, n° 340, Largo do Amparo, Guadalupe/Olinda.

Ao final, será servido o tradicional mungunzá e sambado o coco de roda com mestres e mestras da cultura popular em frente ao terreiro.

Contatos: 81 99525-7119 (Tim e Sapp) – Alexandre L’Omi L’Odò, sacerdote responsável.

Alexandre L’Omi L’Odò
Sacerdote da Casa das Matas do Reis Malunguinho
alexandrelomilodo@gmail.com

Maracatu Nação do Reis Malunguinho - Histórico


Maracatu Nação do Reis Malunguinho
Histórico

Fundado em 2016, no bairro de Peixinhos, em Olinda/PE, o Maracatu Nação do Reis Malunguinho nasceu de uma missão dada pela divindade Malunguinho, ao discípulo/juremeiro Alexandre L’Omi L’Odò, mestre de baque e sacerdote da agremiação. Após L’Omi, ter tido uma forte “irradiação” espiritual, ao acompanhar o Maracatu Leão Coroado, sob a regência de Mestre Afonso Aguiar, em cortejo pelas ruas do Sítio Histórico de Olinda, recorreu à Jurema Sagrada para obter respostas sobre o que havia sido àquela reação espiritual tão forte, que quase o derrubou no chão. Para ele, “tal fenômeno era sem explicação cabível na espiritualidade”. Após consulta ao sagrado, pedindo respostas aos senhores mestres, o Reis Malunguinho manifestou seu desejo, mostrando-o como queria tudo, e o motivo pelo qual desejaria que ele e os filhxs do terreiro agissem dentro deste “brinquedo”. Neste ano, ele realizou os rituais de fundação do Maracatu dentro da Jurema, com rituais de consagração do bombo mestre, primeiro instrumento doado para a instituição, por Rodrigo Fernandes, mestre do Maracatômico.

Após aguardar respostas da espiritualidade, foram reveladas dentro das matas sagradas do Catucá o nome das quatro Calungas determinadas para serem as guardiãs do maracatu. Malunguinho convocou:

1 – Dona Maria do Acaes II – Maria Eugênia Gonçalves Guimarães (falecida em 1937) deixou um legado imenso reconhecido até hoje dentro dos terreiros de Jurema. Seu nome está ligado ao local onde nasceu e se criou, o Sítio do Acaes, terras no município de Alhandra/PB herdadas do seu tio avô, o último cacique da tribo Arataguí. Hoje ela é uma mestra que “baixa” nos terreiros, sendo muito reverenciada como alicerce moral e de grande força espiritual, considerada pelos juremeirxs como a maior mestra na história da religião. 

2 – Mãe Biliu de Manoel do Ororubá (Antônia Montes da Silva - filha de Iyemojá. Nascida em 30/08/1905, falecida em 08 de Agosto de 2012) Juremeira e sacerdotisa do candomblé, falecida com 107 anos no bairro da Mustardinha/Recife. Foi uma das mais importantes lideranças religiosas daquela região, sendo respeitada por todo povo de terreiro. Chegou a ser a mais velha juremeira viva de nosso tempo, levando com força e grande sabedoria seu terreiro, que está aberto e em funcionamento até hoje.

3 – Mãe Biu de Alhandra (Severina Chaves dos Santos) (nascida em 1935, falecida em 16/09/2015) Juremeira nascida no Acaes, viveu sua vida sacerdotal entre Pitimbú e Alhandra na Paraíba, sendo uma das mais sábias e célebres da Jurema. Foi uma das ultimas grandes rezadeiras e catimbozeiras das antigas raízes de Alhandra, sendo reconhecida em vida como mestra dos saberes ancestrais. 

4 – Reis Malunguinho - Patrono do Maracatu e da Casa das Matas do Reis Malunguinho. Divindade que na primeira metade do século XIX fora o mais importante líder quilombola na luta pela liberdade dos povos escravizados de Pernambuco. Foi o único herói negro deificado nas religiões de matrizes afroindígenas, considerado o patrono da Jurema Sagrada, pois só ele, se manifesta em quatro formas diferentes: reis, caboclo, mestre e trunqueiro/exu. Nas Cidades da Jurema e nos terreiros, Malunguinho cumpre sua mesma missão ancestral - defender seu povo, dando continuidade à luta do Quilombo do Catucá.

Em 2018, foi realizada a Consagração pública do baque do maracatu no XIII Kipupa Malunguinho, ocorrido no dia 23 de setembro. Essa foi sua primeira apresentação como instituição oficial. O baque foi recebido pelo Maracatu Nação Malunguinho de Abreu e Lima, fundado em 2017 no XII Kipupa, cujo mestre é Aldene Nascimento, amigo e parceiro de longas datas nas lutas pela cultura popular. Neste momento, foram apresentadas pela primeira vez as quatro Calungas ao público.

No dia 4 de Março de 2019, segunda feira de carnaval, ao meio dia em ponto, será seu primeiro desfile oficial nas ladeiras de Olinda. Seguirá junto com o Bloco dos Catimbozeiros, que também desfila pela primeira vez no carnaval acompanhados pelo calunga gigante do Reis Malunguinho.

As orientações espirituais e éticas que alicerçam este maracatu, serão obedecidas irrestritamente, sendo elas: que o Maracatu deve ser Nação (religioso); que não crie disputas com grupos da cultura afroindígena e popular; que seu baque evoque e louve os ancestrais; que a instituição sirva pra ajudar os povos tradicionais, empobrecidos e demais minorias; que mantenha as tradições antigas de terreiro do maracatu, respeitando e seguindo os rituais deixados pelos nossos mais velhos; lutar com uma perspectiva decolonial, combatendo o racismo, a intolerância religiosa, a LGBTTI+fobia e demais formas de opressão, se posicionando sempre ao lado dos herdeiros da senzala, e nunca da Casa Grande.

Com fé, ciência, fumaça, baque forte, decoloneidade, retorno às origens e respeito aos mais velhos, o Maracatu Nação do Reis Malunguinho é a continuidade da luta do Quilombo do Catucá!

Sobô Nirê Mafá Reis Malunguinho!!
Trunfa Riá!
Nosso baque é forte e tem ciência!

Alexandre L’Omi L’Odò
Mestre de Baque e coordenador
alexandrelomilodo@gmail.com

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Projeto Giras Decoloniais levará conteúdo qualificado de formação intelectual para povo de terreiro

Cartaz do primeiro ciclo de debates das Giras Decoloniais.

Projeto Giras Decoloniais levará conteúdo qualificado de formação intelectual para povo de terreiro

As Giras Decoloniais é um projeto criado por Alexandre L’Omi L’Odò, sacerdote da Casa das Matas do Reis Malunguinho, para dar continuidade ao seu trabalho como educador decolonial desde final da década de 1990 quando ensinava língua, historia e cultura yorùbá, percussão e teologia da Jurema. Em 2004 participou da fundação do Grupo de Estudos Malunguinho, criado para dar visibilidade histórica, sociológica e “teológica” à Jurema Sagrada, iniciativa que se desdobrou na criação do QCM – Quilombo Cultural Malunguinho.

Após larga experiência dando aulas, oficinas, cursos, workshops em terreiros, escolas, universidades, congressos nacionais e internacionais e eventos promovidos por movimentos sociais, negros e de cultura popular, o historiador e mestre em ciências da religião retoma suas atividades com objetivo de formar especialmente pessoas de terreiro e interessadxs na construção de um entendimento epistemológico livre das algemas brancas do pensamento ocidental, contribuindo para a eliminação do racismo e da intolerância religiosa na nossa sociedade.

Serão realizadas trocas de saberes através da tradição oral e de uma bibliografia ampla, trazendo para o centro dos debates/aulas o que existe de mais sofisticado nas discussões afroindígenas no mundo. Sacerdotes/sacerdotisas que atuam também como professores tanto em escolas quanto em universidades serão convidados para compartilhar seus conhecimentos conosco. Ademais, serão oferecidas oficinas de percussão e língua yorùbá. Todas as atividades serão efetuadas no espaço sagrado do terreiro como forma de re-conectar nossas cabeças e corpos a uma metodologia pedagógica essencialmente decolonial, contudo, também haverá atividades em outros espaços.

Todos os encontros acontecerão das 14:00h as 18:00h, com lotação de até 30 (trinta) pessoas. Será cobrada uma contribuição financeira. O conteúdo programático de cada mês será disponibilizado em nossas redes sociais (página do terreiro no facebook) ao fim de cada encontro. Para participar é necessário fazer a inscrição enviando o nome completo, instituição que representa e contato de whatsapp através do e-mail casadasmatasdoreismalunguinho@gmail.com. Programe-se e venha indo-empretecer seu pensamento. Calendário geral de 2019:

FEV: 23 - Giras Decoloniais: Leitura e debate do texto “A tradição viva” de Amadou Hampaté Bá.

MAR: 30 - Giras Decoloniais.
ABR: 27 - Giras Decoloniais.
MAI: 25 - Giras Decoloniais.
JUN: 29 - Giras Decoloniais.
JUL: 21 - Giras Decoloniais.
AGO: 31 - Giras Decoloniais.
SET: As Giras Decoloniais serão substituídas pela Semana Estadual da Vivência e Prática da Cultura Afro Pernambucana. Lei Malunguinho-13.298/2007.
OUT: 26 - Giras Decoloniais.
NOV: 30 - Giras Decoloniais.

Rua de São João, n° 340, Guadalupe -Olinda/PE. No Largo do Amparo, Sítio Histórico de Olinda.

Contatos: 81 995257119 e 81 988871496


Alexandre L’Omi L’Odò
Sacerdote da Casa das Matas do Reis Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Relato das práticas realizadas no Kipupa Malunguinho - Coco na Mata do Catucá

Público no XIII Kipupa Malunguinho. Foto de Kayo na Real.

Relato das práticas realizadas no Kipupa Malunguinho - Coco na Mata do Catucá

O Kipupa Malunguinho - Coco na Mata do Catucá, é uma festa popular, uma celebração coletiva dos povos tradicionais de terreiro, realizada pelo Quilombo Cultural Malunguinho, há 13 anos nas antigas matas do Catucá (quilombo de Malunguinho), hoje Pitanga II, Abreu e Lima/PE. Com vistas à valorizar o patrimônio imaterial da Jurema Sagrada, religião de matriz indígena do Nordeste do Brasil, que tem em Pernambuco, um dos seus maiores redutos em termos de densidade histórico-mítica-ritual-tradicional e de quantidade de terreiros (Só em Recife e RM são mais de 70% dos templos), o Kipupa, dá voz as narrativas orais de nosso povo, incentiva as práticas de sustentabilidade ambiental fomentadas por séculos pelos juremeirxs, e faz de seu local de realização, um espaço permanente de fortalecimento da memória afro indígena e da cultura popular.


O RITUAL

É realizado coletivamente um grande ritual de entrega das oferendas à ancestralidade negríndia, em especial para o Reis Malunguinho, patrono da festa. Esta atividade, que acolhe todas as formas de fé, leva para dentro do espaço mais interno das matas sagradas, em cortejo, com cânticos e toques ritualísticos, o balaio mestre, que é a oferta dada para agradecer aos espíritos da nossa religião por todas as bênçãos alcançadas, além de firmar nossos pedidos de paz, união, fertilidade, saúde, prosperidade etc. para todxs.

O KIPUPINHA

Dentro do Kipupa Malunguinho, o Kipupinha é um espaço infantil e lúdico com os saberes da Jurema para todos os juremeirinhos e juremeirinhas e crianças de quaisquer outras tradições. Esse espaço foi pensado para dar atenção especial na formação afro-indígena, na auto-estima e fortalecimento da identidade de nossas crianças de terreiro. No evento, a cada ano, mais e mais crianças participam e vivenciam este dia de celebração com muita energia e troca de saberes na Mata Sagrada. Portanto, ter um espaço especial lúdico e bem cuidado para estas crianças se faz necessário, uma vez que temos que cuidar de nossas sementinhas e de nosso futuro, com muito zelo e afeto. Esta atividade contempla contação de histórias de nossa tradição oral, oficinas de percussão, pintura, estética afro, confecção de roupas de jurema etc. Também é montado um mini parquinho para que as crianças possam desfrutar de um momento de brincadeiras antigas de terreiro com animadores culturais. Neste contexto, é distribuído o Cosme Damião, com muitos doces e brinquedos.

A FEIRA PRETÍNDIA MALUNGUINHO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA

A Feira tem como objetivo apresentar uma diversidade de produtos ligados à Jurema e as tradições de terreiro, como ervas, artefatos religiosos, roupas, colares, instrumentos musicais, cachimbos e todo tipo de artesanato ligado ao imaginário afro-indígena, com o intuito de fortalecer a nossa identidade e contribuir no crescimento de investimentos em projetos negro-indígenas no mercado de artesanato deste segmento. A feita também tem um processo educativo que foca na sustentabilidade ambiental.

ETAPA EDUCATIVA DO KIPUPA

São realizadas palestras e formações durante a Semana Estadual da Vivência e Prática da Cultura Afro Pernambucana, a Lei Malunguinho, nº 13.298/07, aprovada a partir de nossa construção coletiva. Atividades de troca de saberes na mata, com trilha ecológica, formações na cultura popular, formação sobre a Jurema Sagrada e a prática de ervas, cursos sobre línguas africanas e indígenas e palestras em escolas públicas dão o tom das semanas que antecedem o ponto máximo do festival.


ACESSIBILIDADE

O Kipupa, é um evento que obedece as normas estabelecidas pela lei federal de acessibilidade 10.098/2000, garantindo acesso seguro e adequado à todas e todos. Criteriosamente atendemos as normas do estatuto do idoso – lei 10.741/03, e, da lei para pessoas com deficiência – 13.146/2015.


É garantido durante todo o evento, intérprete em libras, banheiros para deficientes, estacionamento e tratamento especial para idosos (incluindo segurança e atendimento médico permanente), e a tradicional atenção milenar afro indígenas para as pessoas mais velhas, traço fundamental de nossa cultura.


A MATA E O CUIDADO COM O MEIO AMBIENTE

Em nossa última edição (2018), reunimos mais de 10 mil pessoas no Kipupa. Contudo, todo ambiente é preparado para não haver impactos negativos para o meio ambiente. A mata é preservada completamente. Temos equipe de coleta de lixo durante todo evento e somos associados a cooperativa de reciclagem de Abreu e Lima. Todo material reciclável deixado pelo evento, é recolhido e reutilizado. Dentro do espaço da Mata Sagrada, no dia seguinte das atividades, recolhemos com outra equipe, todos os objetos que por ventura tenham sido deixados pelo povo de terreiro no local. Nada fica, nem as "piolas" de cigarro e restos de vela (velas são proibidas). Nossa preocupação é com o meio ambiente, que para nós é sagrado, nosso altar maior.

A COMUNIDADE - BENEFÍCIOS E INTERAÇÃO

O Kipupa, é um evento que traz inúmeros benefícios às suas comunidades, tanto a do povo de terreiro, quanto a de Pitanga II, em Abreu e Lima. Na cidade onde proporcionalmente há o maior contingente de evangélicos no Brasil, é realizada a maior festa do povo de terreiro de Pernambuco. Isso significa muito na luta antirracista e contra a intolerância religiosa, sendo este elemento, um dos que transforma-se em benefício para todas e todos que desejam um mundo equânime.


a)    Para a comunidade dos Povos Tradicionais de Terreiro, a ação, há 13 anos fortalece o reconhecimento da tradição da Jurema no cenário da luta por direitos e por reconhecimento oficial, tanto do Estado, como do campo acadêmico, tendo em vista, que essa tradição, sofre racismo institucional e epistemológico (acadêmico), sendo quase desconhecida do cenário das religiões de terreiro, nesses campos. Conhece-se o candomblé e a umbanda, porém, a Jurema, mantem-se quase desconhecida, ainda. O Kipupa, anualmente realiza forte divulgação nas redes sociais e na grande mídia, contribuindo para o processo de retirada deste conjunto de tradições de matrizes indígenas do ostracismo social e histórico. A realização do evento, dá uma oportunidade de auto reconhecimento para o povo da jurema, de seus valores, beleza, importância histórica e social, além de contribuir para auto estima de seus membros, que até os dias atuais, tem dificuldade de se identificarem como tal, devido ao perverso processo de estigmatização sofrido pelo nosso povo. Ser catimbozeiro/juremeiro, ainda é um desafio para muitos, que devido ao medo do racismo e de toda forma de intolerância, optam por se auto identificarem como pessoas do CANDOMBLÉ, religião mais aceita e conhecida no cenário nacional. Ainda, o Kipupa contribui para o processo de união do povo da jurema, que ao longo dos séculos, foi separado propositalmente para não permitir seu fortalecimento político, ideológico.

b)    Para a comunidade onde o evento é realizado, muitos são os benefícios materiais. Para a realização do evento, são recapeados mais de 12km de estrada de barro, que após o evento, ficam preservadas por mais de 6 meses, beneficiando toda comunidade rural de Pitanga I e II. Os mais de 10 hectares de terra, limpos, capinados e reestruturados com remoção de entulhos, barro etc. também ajudam a comunidade à se organizar melhor durante mais de 6 meses do ano. Os moradores e moradoras, no dia da ação, colocam suas casas a disposição para receber os visitantes, ganhando dinheiro com estacionamento, vendas de comidas e bebidas, artesanatos e tudo que é produzido ali, como verduras e tubérculos, frutas etc. produtos que são vendidos a preço barato, atraindo o interesse dos compradores. O Kipupa é a única atividade que acontece naquela região o ano inteiro, portanto, é esperado por todas e todos, que ali moram, movimentando toda localidade financeiramente e levando entretenimento consequentemente para todas e todos, que neste dia, tem acesso a shows de qualidade, e tudo mais que o evento oferece, inclusive à etapa educativa.

c)    O espaço de memória quilombola, é mais um ganho para a comunidade. Pitanga II, nunca foi reconhecida oficialmente como área quilombola, contudo, esse processo de reconhecimento da localidade, vem sendo oficializado lentamente através do QCM. A comunidade hoje, já sabe que ali fora em séculos passados, palco de grandes lutas negras e também local onde fora morto o último dos malunguinhos, o João Batista, morto naquela localidade há 184 anos, em emboscada cruel. A construção desse processo de reconhecimento, caminha há 15 anos, quando ainda nem o Kipupa existira. O Quilombo Cultural Malunguinho, instituição realizadora do Kipupa, sempre protagonizou essa discussão junto à comunidade, levando pesquisadores de diversas partes do país para conhecer e produzir conteúdo científico antropológico e histórico sobre toda essa localidade. Dois dos maiores historiadores brasileiro, que pesquisam a história da luta por liberdade do povo negro e indígena no país, já publicaram importantes artigos sobre. Marcus Carvalho, professor titular de história da UFPE e João José Reis, titular de história da UFBA, são nossos parceiros nessa luta. 


TROCA DE SABERES E MANUTENÇÃO DE NOSSAS PRÁTICAS

A tradição oral é o patrimônio pelo qual mais prezamos. É espontaneamente oportunizado pelo evento, a possibilidade dos terreiros trocarem saberes e fortalecerem suas articulações religiosas e de amizade. Muitos rituais são mantidos e ampliados com essa troca de saberes. A Jurema que é uma religião em risco de extinção, com o Kipupa, retomou o fôlego e se amplia mais a mais, pois a cada ano o público aumenta inesperadamente, devido ao fortalecimento da auto estima desse povo que sofre até hoje os males da escravidão e do racismo histórico de nossa sociedade.

PRÊMIO MOURÃO QUE NÃO BAMBEIA

Ao longo dos seus 8 anos de existência (2011-2018), o Prêmio Mourão Que Não Bambeia, homenageou publicamente 53 sacerdotes e sacerdotisas da Jurema Sagrada, ajudando a contar a histórias silenciada pelo tempo, dessas pessoas humildes, que são, ou foram, grandes mestres do saber ancestral tradicional da Jurema. Figuras desconhecidas, esquecidas pela historiografia, que embora tenham grandiosa contribuição na preservação da memória e das práticas da Jurema tradicional, não eram conhecidas do grande público, nem mesmo da religião. Mestres como Deotato (Dió), Mestra Elisa do Coco, Mestre Ciriaco de Alhandra, Mestra Alaíde de Benedito Fumaça, Mãe Terezinha Bulões, Dona Sílvia de Iemanjá, Pai Ednaldo de Boiadeiro, Mãe Nenzinha do Acorda Povo, Mãe Leônidas Costa (in memorian), Sr. João Folha (in memorian), etc., foram alguns nomes lembrados por essa nossa homenagem, que tem como objetivo central, trazer à luz da história pública, a contribuição fundamental que estes ilustres desconhecidos, deram à tudo que conhecemos hoje como Jurema e tradição de terreiro em Pernambuco. O conjunto dessas memórias orais densas, está guardado em nosso arquivo, para futuras publicações, que garantam o registro oficial da existência desses e dessas personagens que são a alma de nossa religião.

Para saber detalhes do Prêmio, leia:

O Prêmio Mourão que Não Bambeia é uma comenda dada a grandes representatividades de nossa Jurema Sagrada, e também para pessoas que contribuem na luta por nossos direitos. Pensado por Alexandre L’Omi L’Odò, há oito anos, este Prêmio tem homenageado pessoas que fortalecem a Jurema com responsabilidade sacerdotal e empenho nas causas de nosso povo.

Mourão, é um tronco de madeira de lei, que é colocado no centro de um terreiro para amarrar boi brabo ou cavalos indomáveis. Esta madeira forte, geralmente é de Pau Pereiro, ou de outra madeira de lei como Pau Ferro etc. É conhecido por ser inabalável e jamais cair, suportado todo tipo de força externa. Ele jamais bambeia, ou fraqueja, ele sempre segura o tombo do que vier. 

Portanto, o Prêmio Mourão que Não Bambeia reconhece a força inabalável da fé e da luta de nossos juremeiros e juremeiras, que resistem a toda forma de adversidade nos caminhos da preservação de nossos patrimônios imateriais/ materiais e da prática religiosa da Jurema Sagrada como um todo. Premiamos também pessoas que nos ajudam a vencer os processos históricos de racismo e intolerância religiosa, como pesquisadores, políticos e ativistas sociais dentre outros.

BANDAS, SHOWS, CORTEJOS E MESTRES E MESTRAS DA CULTURA POPULAR

Em 13 edições, o Kipupa realizou 29 shows, trazendo para seu palco, atrações e mestras(es) de grande relevância da cultura popular e tradicional, garantindo uma diversidade de linguagens ampla de apresentações. Entre estes, destacamos o Mestre Galo Preto, Mestre Zé de Teté, Mestra Elisa do Coco, Mestra Ana Lucia do Coco, Grupo Bongar, Grupo Bojo da Macaíba, Coco do Catucá, Mestre Zeca do Rolete, Grupo Mazurca da Quixaba, Caboclinhos Carijós do Recife, Maracatu Nação do Reis Malunguinho, Banda Pandeiro do Mestre, etc.

Estas atrações, durante 12 anos do evento, tocaram gratuitamente, levando o melhor do entretenimento e da nossa cultura, para um público amplo e bem direcionado. Somente em 2018, aprovamos nosso primeiro edital, após sermos reprovados em diversos outros, garantindo pela primeira vez pagar cachê para as atrações.

O trabalho do Kipupa sempre foi colaborativo, tendo como principal força, a rede de amigos e amigas que acreditam nessa proposta e que se esforçam para estar conosco todos os anos. Não geramos renda com o evento, sendo assim, dependemos de apoios até mesmo de pessoas para conseguirmos realizar esta festa que se transformou espontaneamente no Encontro Nacional dos Juremeixs.


#KipupaMalunguinho #Catucá #QuilomboCulturalMalunguinho

Alexandre L'Omi L'Odò
Coordenador Geral Kipupa
alexandrelomilodo@gmail.com

Quilombo Cultural Malunguinho

Quilombo Cultural Malunguinho
Entidade cultural da resistência negra pernambucana, luta e educação através da religião negra e indígena e da cultura afro-brasileira!