quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

A Ciência Encantada: ensaio fotoetnografico em um terreiro de Jurema Sagrada

 

Capa da Revista indisciplinar, v. 7, nº 1. Foto de Clédisson Jr

A Ciência Encantada: ensaio fotoetnografico em um terreiro de Jurema Sagrada.

The Enchanted Sciences: Photoethnographic essay in a Jurema Sagrada yard.

Por Clédisson Júnior*

 

Este ensaio fotoetnografico  (ACHUTTI,  1997)    foi  realizado em Olinda, cidade da região metropolitana do Recife (PE). As imagens obtidas durante este ritual na Casa  das  Matas  do Reis Malunguinho constituíram-se em um exercício de escrita narrativa conduzida pela análise das imagens produzidas em um contexto de pesquisa de mestrado.

 

Espaços de reinvenção do viver foram captados por meio destas imagens e contribuíram para a transmissão desse universo, de intensa sensibilidade e abertura  para  a  relação  com  o outro.  Olhares que revelam dinâmicas próprias, as imagens permitiram, ao longo desta pesquisa etnográfica, estabelecer relações, evidenciando a experiência da diferença, assim como uma tentativa de revelar um ambiente muito particular de um terreiro da Jurema Sagrada.

 

Terreiros são estes espaços onde se celebram as festas dos orixás, das entidades espirituais e encantadas. É o espaço onde acontece todo princípio dinâmico, portanto complexo, onde os rituais se realizam e as relações se  intensificam  entre  os praticantes das religiões afro brasileiras. É no terreiro que os “filhos de santo” dançam ao som dos atabaques e seus corpos entram em transe. Mais ainda, o terreiro como espaço dinâmico é o cenário sagrado em que se celebram a vida, os deuses contam suas estórias através da dança e do gesto. Como um espaço cênico, o terreiro é o espaço do movimento, do devir e da complexidade.

 

As invenções dos terreiros na diáspora evidenciam a complexidade dos modos de vida aqui reconfigurados. As diferentes configurações de terreiros nos mostram que eles podem refletir desde uma busca por ressignificação da vida a partir de um referencial do que seria esta vida no continente africano antes da invasão europeia, assim como também aponta para disputas e alianças travadas  na  elaboração  de  novas práticas e sociabilidades entre os indivíduos que se organizam neste território.

 

O que a noção de terreiro  abrange  é  a  possibilidade  de  se constituir  enquanto  territórios  existenciais  (GUATTARI,  1992), na  ausência  de  um  espaço  físico  permanente  abrindo  assim possibilidades para pensar essa noção a partir do rito.

 

O culto da Jurema Sagrada é compreendido como uma tradição de conhecimento que procede da  articulação  de  diferentes fluxos  culturais,  resultante  de  uma  práxis  ritualística  cujos sujeitos  operam  com  criatividade  e  fluidez. 

 

A Jurema é uma ciência, que é operado pelos seus técnicos, mulheres e homens de notório saber dentro do culto que a aplica em curas físicas e espirituais, dentro do que os juremeiros chamam de “trabalho de ciência”. Na Jurema a produção epistemológica adotada  contraria  o projeto político da modernidade, é um perspectivismo que se referência nas encruzilhadas, que reivindica uma entre tantas formas de conhecimento praticado no mundo. Esta produção do conhecimento aponta para um exercício complexo sobre a urgência de um debate político e ontológico no campo das existências. 

Ao se  afirmar a  emergência  de  uma  “ciência encantada”,  referenciada  na  tradição  indígena  e  africana  e aqui  (re)territorializada  no  espaço  das  encruzilhadas  busca-se reforçar o argumento da pluriversalização do conhecimento, das  diferentes  formas  de  experienciar  nossas  existências  no mundo. Enfatizar uma dimensão alternativa na produção epistemológica, contudo não se traduz em produzir uma negação da racionalidade moderna ocidental, propondo deste modo uma via subalterna. A encruzilhada enquanto referencial geofilosofico visa assumir a dimensão polirracional, pluriversal e plurilinguísta do mundo.

 

Um terreiro da Jurema Sagrada enquanto espaço de produção de  vida  de  grupos  minoritários,  se  torna  um  instrumento  de desconstrução  dos  discursos  e  das  práticas  violentas  da modernidade,  contribuindo  com  releituras  sobre  o  processo de  formação  sócio-territorial  da  América  Latina  rompendo com um paradigma marcado pelas categorias impostas desde a  racionalidade  moderna  e  chamando  para  si  uma  atenção especial  acerca  dessas  outras  racionalidades  apagadas  pela história, pelos processos de dominação colonial, pela expansão homogeneizante de um capitalismo racista (QUIJANO, 2005).

 

Para  a  Jurema  Sagrada  e  seus  praticantes,  o  território,  no mesmo  sentido  que  a  tradição,  não  é  um  elemento  estático e  imutável,  ambos  sofrem  de  um  reordenamento  diante  dos desafios da contemporaneidade. Isto é, o território é a medida de uma identidade não essencial, mas que está marcado pelo convívio com conflitos permanentes. Conflitos cosmopolíticos (ANJOS, 2006). Os juremeiros instauram o devir como o regime político do religioso por meio de um processo antropofágico em busca da complementariedade. É essa ontologia que permite a permanência de uma religião indígena (somada a referenciais cosmológicos africanos e um  catolicismo  popular)  desde  a invasão dos europeus nas Américas no interminável século XV.

 

Referências

ACHUTTI,  L.  E.  R. Fotoetnografia:  um  estudo  de  antropologia visual sobre cotidiano, lixo e trabalho. 1a ed. Porto Alegre, RS : Livraria Palmarinca : Tomo Editorial, 1997.

ANJOS,  José  Carlos  dos. No  território  da  Linha  Cruzada:   a   cosmopolítica afrobrasileira. Porto Alegre: Editora da UFRGS/ Fundação Cultural Palmares, 2006.

GUATTARI, Félix. Caosmose: um novo paradigma estético. Trad. Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão. São Paulo, Editora 34, 1992.

QUIJANO,  Aníbal. Colonialidade   do  poder,   eurocentrismo   e   América  Latina.  In:  Lander,  Edgardo  (org.)  A  colonialidade  do saber: eurocentrismo e ciências sociais. 2005.

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Publico aqui texto integral e fotografias da publicação na revista Indisciplinar, v. 7, nº 1 de dezembro de 2021, de autoria de Clédisson Jr, doutorando em Ciências Sociais, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pela UFRRJ, que há alguns anos pesquisa na Casa das Matas do Reis Malunguinho. Em suas imersões, deu luz a dissertação de mestrado com o titulo: TERRITÓRIO ENCANTADO: o devir-quilombola e a cosmopolítica afro indígena brasileira (2019), que teve como principal campo a Casa das Matas do Reis Malunguinho e seu cotidiano, rituais e lutas políticas. Como pesquisador muito competente, Clédisson tornou-se nosso amigo sendo admirado por todos nós pelos seus textos, fotografias e ações.


Link para acessar a revista e demais artigos: https://periodicos.ufmg.br/index.php/indisciplinar/issue/view/1789  


Sempre lutamos para que a Jurema Sagrada fosse melhor vista no cenário nacional das religiões, luta com total êxito realizada pelo Quilombo Cultural Malunguinho  ao longo dos últimos 20 anos, tirando essa tradição do ostracismo histórico e acadêmico. Essa publicação é mais um exemplo do quanto essa missão vem sendo bem cumprida. A Casa das Matas, terreiro de Jurema em Olinda já tem em sua histórias algumas teses e dissertações de mestrado, além de artigos, publicações e documentários. Assim seguimos com a força do Reis das Matas!! 


Alexandre L'Omi L'Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com 

sábado, 11 de dezembro de 2021

Malunguinho: da narrativa histórica à estética digital (defesa da tese de doutorado)


MALUNGUINHO: DA NARRATIVA HISTÓRICA À ESTÉTICA DIGITAL

DEFESA DA TESE DE DOUTORADO

 

AUTOR: MARCUS VINICIUS RIOS BARRETO (Doutorando em Antropologia Social - PPGAS/FFLCH/USP)

 

Malunguinho é o nome do líder do Quilombo do Catucá, formado na primeira metade do século XIX na zona da mata localizada no atual Estado de Pernambuco. Em 2006, alguns atores do contexto pernambucano criaram um grupo de estudos com o objetivo de pesquisar as narrativas construídas acerca desse líder e elaborar estratégias que permitissem conferir visibilidade à Malunguinho para, então, pleitear ao Estado seu reconhecimento legal. No decorrer de processos complementares, esses atores agenciaram as narrativas históricas, criaram redes sociais e produziram um acervo digital a partir de documentos e, principalmente, de imagens – gráficas, fotográficas e audiovisuais – no intuito de conferir autenticidade a tais narrativas, transformando Malunguinho em uma espécie de ícone regional. Paralelamente, eles dialogaram com agentes públicos a fim de que esse ícone fosse reconhecido como patrimônio. Dessa maneira, tomei como foco de pesquisa o problema do reconhecimento propondo-me a analisar os critérios de agenciamento e produção de fontes materiais colocados em ação nesses processos. Tendo como referência o estudo de caso de uma personagem histórica – Malunguinho – investiguei as estratégias de autenticação documental e, sobretudo, estética dessa personagem em nome da qual os atores envolvidos reivindicaram determinados direitos.

 

Data: 13/12/2021, às 9h.

OBS: tendo em vista que a Defesa ocorrerá pela Plataforma Google Meet, além dos membros da Banca Examinadora, o link será disponibilizado para alguns participantes externos. Posteriormente, a gravação da Defesa será compartilhada pelo Youtube.

 

Esse é mais um trabalho acadêmico que registra a histórica contribuição do Quilombo Cultural Malunguinho, da Casa das Matas do Reis Malunguinho e em especial de Alexandre L’Omi L’Odò na revolução da Jurema Sagrada e tudo que está ao seu redor. Mais um texto qualificado para o avanço dos estudos juremológicos que dão caminhos para o fortalecimento de um povo tão subalternizado.

 

Alexandre L’Omi L’Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Mestra Têca de Oyá, um patrimônio do povo de terreiro de Pernambuco

 

Mestra Têca cantando para a Jurema Sagrada na Casa das Matas do Reis Malunguinho (2021). Foto de Monique Silva.

Mestra Têca de Oyá, um patrimônio do povo de terreiro de Pernambuco

Mestra Têca de Oyá (Terezinha José dos Santos) é um dos mais valiosos patrimônios dos povos tradicionais de terreiro em Recife e Região Metropolitana. Com contribuição histórica, entregou sua vida às giras, cantando, dançando e dando grandes ensinamentos negríndios para os signatários das tradições da Jurema e do candomblé. São 61 anos dedicados à manutenção e preservação de cânticos sagrados de grande valor religioso.

Têca, resguarda em si todas as transformações que o povo de terreiro sofreu nas últimas décadas, sendo ela, uma valiosa biblioteca/patrimônio vivo. Sua especialidade é cantar. Abrir e fechar giras, invocar o sagrado, dar força ao axé dos terreiros, ser a voz dos encantados. Foi homenageada em 2018 como Mourão que não Bambeia no XVIII Kipupa Malunguinho – Coco na Mata do Catucá, sendo reconhecida publicamente pela primeira vez nessa ocasião. 

Mestra Têca recebendo o Prêmio Mourão que não Bambeia em 2018 no Kipupa Malunguinho. Reconhecimento merecido. Homenagem entregue por Pai Messias de Ogun e Mané da Pinga. Foto de Adriana Preta.


Hoje, com grande desejo de perpetuar seus saberes, dedica-se à registrar os cânticos antigos e sagrados de sua Jurema, onde salvaguardam muitos segredos, fundamentos e história. Sem importantes registros imagéticos, de audiovisual etc., afinal sempre esteve a margem da história pública, tem na oralidade, em sua tradição oral seu maior documento histórico.

Atualmente, Mestra Têca está sendo protagonista da gravação de seu próprio filme, cujo nome não revelamos ainda. Esse trabalho é a continuidade do projeto Mourão que não Bambeia, que tem como objetivo principal registrar a história, memória, e a fala dos mestres e mestras dos terreiros de Pernambuco, em especial os que já foram homenageados no Kipupa. Desde o início do Prêmio Mourão (2012), já foram reconhecidos e reconhecidas mais de 53 juremeiros e juremeiras e pessoas do candomblé além de pessoas importantes para o fortalecimento das nossas tradições negríndias. O primeiro filme lançado foi o "Mãe Terezinha Bulhões - um mar de amor no coração do Recife", publicado recentemente em decorrência de seu falecimento aos 91 anos. 

  A obra dirigida por Alexandre L'Omi L'Odò, tem previsão de lançamento no final de 2022 e está a todo vapor em seu processo de construção. Têca, como gosta de ser chamada, está muito feliz com todo esse movimento. Ela relata que "nunca fui reconhecida. Já ajudei tanta gente nos seus terreiros e as pessoas só me usavam. Estou feliz em poder mostrar um pouquinho do que sei e do que me foi permitido aprender nessa religião que é minha vida". 

Há um documento vivo que temos que salvar do apagamento. Ele está na tradição oral. Na memória dos mestres e mestras de terreiro. Além disso o processo de apagamento da existência de pessoas importantes das casas de axé e Jurema é muito agressivo. Poucos são os que têm um registro minimamente organizado para que sua história e contribuição seja conhecida pelas gerações futuras. Esse é um problema grave do povo de terreiro, e esse projeto tem o desejo de contribuir para que seja a cada dia menos possível a continuidade desse apagamento racista dos nomes e feitos de nossos sacerdotes e sacerdotisas de terreiro.

Abaixo, disponibilizo alguns registros fotográficos da Mestra Têca, para que possamos ver em imagem o quanto ela é expressiva e linda com sua energia única. Têca é vento, é furacão, é o canto e a dança dos terreiros. Devemos valorizar!

Mestra Têca cantando para o grande público do Kipupa Malunguinho (2018). Foto de Adriana Preta.

Recebendo homenagem surpresa na Casa das Matas do Reis Malunguinho (agosto de 2021). A foto do quadro e essa são de Monique Silva.

Cantando pra Malunguinho na Casa das Matas do Reis Malunguinho (agosto de 2021). Foto de Monique Silva.

Com seus 75 anos de idade tem vitalidade que menino novo não tem. Foto de Monique Silva.

A tradição em pessoa. Foto de Monique Silva.

Sabe cantar muito pra Jurema. Tem axé e traz os espíritos à terra! Foto de Monique Silva.

Têca no XVI Kipupa Malunguinho (2020). Foto de Monique Silva.

Teca cantando para Exu/trunqueiros na Jurema. Foto de Monique Silva.

Na frente dos ilús ela dá seu show de axé. Foto de Monique Silva.

Com Alexandre L'Omi L'Odò, diretor de seu filme (2019). Foto de Monique Silva.

Dando seu recado na pisada mestra. Foto de Monique Silva.

É Mourão que não Bambeia - Mestra Têca de Oyá. Foto de Monique Silva.

Triunfando na Jurema. Casa das Matas do Reis Malunguinho. Foto de Monique Silva. 

Nas giras da Casa das Matas do Reis Malunguinho, sempre ajudando nos trabalhos. Foto de Monique Silva.

Para maior conhecimento do projeto Mourão que não Bambeia, veja o filme de Mãe Terezinha Bulhões no link: https://www.youtube.com/watch?v=jpOQRg1r54s&t=802s


Alexandre L'Omi L'Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com 

domingo, 14 de novembro de 2021

Filme Mãe Terezinha Bulhões – um mar de amor no coração do Recife (43’41)


Filme Mãe Terezinha Bulhões – um mar de amor no coração do Recife (43’41)


Existiu um mar de amor, caridade, verdade e fé no coração do Recife pulsando há 91 anos. Espalhando acolhimento e muito axé, Mãe Terezinha Bulhões, foi uma das juremeiras e iyalorixás mais antigas de Pernambuco vivas e ativas em seus trabalhos espirituais e sociais. Com incontáveis filhos e filhas na religião, tendo prestado assistência há toda sua comunidade em sua trajetória, ela é uma referência importante da religião de matriz africana e indígena no Brasil, herdeira e continuadora das insígnias sagradas do candomblé e da Jurema Sagrada, um verdadeiro patrimônio vivo dos povos tradicionais de terreiro.

Infelizmente se encantou no dia 13 de novembro de 2021, deixando uma lacuna profunda na tradição de mátria africana e indígena no Brasil. Mais uma biblioteca viva se foi deixando grandes saberes da vida para quem vivenciou toda sua bondade e axé.

Como homenagem à sua trajetória e fundamental contribuição à nossa religião, Alexandre L’Omi L’Odò assumiu o papel de diretor e roteirista de um filme (média metragem) que registra a memória e história dessa grande liderança religiosa de nosso tempo, cujo nenhum registro oficial e documental sistematizado consta de sua existência, até então. Com produção audiovisual do Angola Filmes e realização do Quilombo Cultural Malunguinho e a Casa das Matas do Reis Malunguinho, o projeto Mourão que não Bambeia, que tem como objetivo registrar e salvaguardar a memória, história oral e tradicional do povo de terreiro de nosso Estado através de pesquisa e registro documental e audiovisual, faz nascer seu primeiro trabalho de preservação de memória oral dos grandes sacerdotes e sacerdotisas da religião de terreiro em Pernambuco.

A missão desse filme é eternizar a memória de Mãe Terezinha Bulhões, trazendo-a como protagonista de sua própria história, mostrando à toda sociedade que ela existiu e que merece respeito histórico. Esse projeto é anti apagamento da memória ancestral, afinal sabemos que existe uma lacuna imensa a ser preenchida sobre a história de nossa religião. Quase não há registros qualificados dos mais velhos dos terreiros e quando esses e essas morrem, toda sua trajetória se apaga no mar do esquecimento do racismo estrutural que nos assola socialmente. Temos que barrar esse processo e dar voz e vez à pessoas como Mãe Terezinha e tantas outras que merecem ser reconhecidas ainda em vida pela sua importante contribuição na história e desenvolvimento da sociedade como um todo.

Atenciosa, carinhosa e muito acessível, mesmo na altura dos seus 91 anos, dava atenção e ouvia cada filho e filha. Realiza anualmente todos os ciclos festivos da religião e adora dançar um coco. Essa é a filha dileta de Iyemojá Sessú, uma mulher guerreira que distribuiu muito amor com todes, mesmo tendo sofrido tanto em sua infância.

No coração do Recife existiu um mar, um oceano de amor sim, lá na Vila das Lavadeiras (Rua Palmares, nº 56, Areias) morou a felicidade e a resistência negro-indígena dos povos tradicionais de terreiro e toda sua história que forma a identidade deste país que precisa se encontrar consigo próprio para se reconhecer. 

O filme foi lançado no dia de seu aniversário, 07 de outubro de 2020, data de seu aniversário de 90 anos, com apresentações de maracatu e coco, exibição do filme para toda comunidade e celebração coletiva de seu aniversário. Foi um momento ímpar registrado na alma de todos nós.

Com autorização da família, publico seu filme, sua memória, sua fala, e sua luta. Esse trabalho foi feito com muito amor e respeito. Mãe Terezinha sempre foi muito admirada por mim e por todos. Sinto-me honrado de ter sido escolhido pela espiritualidade para fazer e concluir esse trabalho único. Obrigado Iyemojá Sessú e Reis Malunguinho.

Ela com certeza toda Jurema a recebeu com alegria e luz. Com tanta humanidade e amor, ela hoje descansa leve com todo seu dever ancestral cumprido na terra. Bença mãe Terezinha, até breve. Obrigado por tudo que sua existência me ensinou.

Ficha Técnica

Concepção, Roteiro, Pesquisa e Direção: Alexandre L’Omi L’Odò

Produção Audiovisual: Angola Filmes

Produção Executiva: Alexandre L’Omi L’Odò

Fotografia, Montagem e Finalização: Adriano Lima

Assistentes de Edição: Pollyanne Carlos e Zé Gabriel

Assistentes de Produção: Diviol Lira e Welica Terezinha e Daniel Menezes

Assistente de Gravação: Diviol Lira

Projeto Gráfico/Cartaz: Adriano Lima

Articulação e Produção: Nadja de Oyá, Vado de Pau Ferro e Carolina Bulhões

Trilha Sonora Original: Alexandre L’Omi L’Odò e Obé Iná

Direção de Arte, figurino e dançarina (Iyemojá): Obé Iná

Realização Geral: Quilombo Cultural Malunguinho e Casa das Matas do Reis Malunguinho


Participações/depoimentos:

Pai Vado de Pau Ferro (juremeiro e babalorixá)

Pai Paulinho da Luz (babalorixá e juremeiro)

Hilton Bulhões (filho carnal)


ATENÇÃO: Está proibido o download desse filme, completo ou suas partes, para publicação em páginas de instagran, facebook e youtube de terceiros sem autorização do diretor.

Link do filme: https://www.youtube.com/watch?v=jpOQRg1r54s&t=767s 


Alexandre L'Omi L'Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com

sábado, 13 de novembro de 2021

Um adeus à Mãe Terezinha Bulhões - nota de falecimento

 

Mãe Terezinha Bulões - um mar de amor no coração do Recife. Foto: Acervo Casa das Matas do Reis Malunguinho


Um adeus à Mãe Terezinha Bulhões

 

Comunicamos o falecimento de uma das mais antigas juremeiras e iyalorixás de Pernambuco, Mãe Terezinha de Iyemojá Sesú.

Com 91 anos de idade e mais de 70 dedicados à religião, faleceu hoje, 13 de novembro pela manhã.

Ela, sem dúvidas é um dos mais importantes patrimônios do povo de terrieiro, tendo dado importante contribuição durante todo seu sacerdócio na preservação dos saberes e costumes das tradições de matriz afro indígena. Ajudou com seu acolhimento inúmeras pessoas e alimentou outras incontáveis. Conhecida pela sua bondade e sabedoria, Mãe Terezinha deixa uma lacuna enorme entre nós, pois estão a cada dia mais raras pessoas de coração puro e bondoso como o dela em sua natureza plena.

Teve sua vida e trajetória registrada no filme intitulado "Mãe Terezinha Bulhões - um mar de amor no coração do Recife", concebido e dirigido por Alexandre L'Omi L'Odò, lançado em 2020, no dia 07 de outubro, em celebração aos seus 90 anos de idade e luta. Na película, ela conta sua história e nos encanta com tamanha beleza de seus saberes.

A saudade será eterna. Obrigado por ter existido. Olorun e todos Orixás e a Jurema Sagrada hoje perderam uma importante representação. Contudo sua missão foi totalmente cumprida perante a ancestralidade.

Nossos pêsames à família carnal, aos filhos e filhas de axé e Jurema, amigues e toda comunidade da Vila das Lavadeiras em Areias/Recife.

O Quilombo Cultural Malunguinho agradece os inúmeros anos de parceria e luta pela valorização pública da Jurema. Serás eterna Mourão que não Bambeia do Kipupa.

--> Velório às 17h (hoje), no terreiro na Praça da Vila das Lavadeiras/Areias, sepultamento amanhã 14/11 no Cemitério do Barro com continuação do velório às 11h.

Seguem algumas fotos do lançamento de seu filme. Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho:


Mãe Terezinha Bulhões. Foto acervo Casa das Matas do Reis Malunguinho.

 

Mãe Terezinha e eu após as filmagens de seu filme. Foto do Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho.

Em seu aniversário, ela celebrou louvando Iyemojá Sessú antes do lançamento do filme.  Foto do Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho.


Entrevistando a Iyalorixá.  Foto do Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho.


Bolo de 90 anos. Dia especial em 2020.  Foto do Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho.


Filhos e filhas da Casa das Matas do Reis Malunguinho comemorando os 90 anos de Mãe Terezinha. Todos participaram da produção desse lançamento. Foi lindo.  Foto do Acervo da Casa das Matas do Reis Malunguinho.


Àsèsè mojubá!

"Caiu uma folha na Jurema"

 

Alexandre L’Omi L’Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Malunguinho, Catucá e Abreu e Lima - histórias de luta


Malunguinho, Catucá e Abreu e Lima – histórias de luta 

Malunguinho fora o título dado aos líderes do Quilombo do Catucá, pessoas de grande transcendência e força que lideraram a segunda maior frente de luta por liberdade negra no Brasil. 115 anos aproximadamente separam Palmares do Catucá (1695 – 1810), e Pernambuco fora na primeira metade do século XIX o mais amplo e articulado campo para o desenvolvimento desse clã negro de luta, que segundo Pereira da Costa agia de forma a remontar as práticas africanas bantas e também exerciam uma forma de convívio comunista, tendo como participes indígenas, alguns brancos e mulheres que exerceram importante papel na consolidação e resistência do quilombo.

O Catucá iniciava-se nas abundantes matas e mangues nas margens do Rio Beberibe entre Recife e Olinda (onde hoje é Peixinhos e demais bairros), ampliando-se e dominando importante parte da Mata Norte, seguindo por Paulista, Abreu e Lima (antiga Maricota), Igarassu, Paudalho, Timbaúba, entre outros municípios até Goiana (onde existe um povoado quilombola recém reconhecido chamado de Catucá) até Alhandra na Paraíba.

Na história do país, não existiu negro a ter a cabeça colocada a prêmio por valor mais alto. Malunguinho (o primeiro cujo nome não foi revelado), devido a sua importante liderança e poder, aterrorizou a Coroa portuguesa que anunciou o valor de 100 mil réis para quem o entregassem morto. Com as elites fragilizadas pelas fraturas internas e revoluções, que fragilizaram seus aparatos repressivos devido as lutas armadas entre 1817 e 1824, o Catucá se fortaleceu, muitos negros e negras fugiram para as matas e conseguiram assim se unir ao ponto de colocar em risco a estabilidade da coroa e a segurança de toda população branca. Realizando inúmeros saques de alimentos e ocupações de mais e mais territórios, onde construíram casas, mocambos e plantações, os malungos como também eram chamados, instituíram-se como força bélica de grande porte, atormentando o sono dos colonizadores. Assim sendo, foi criada a “partida exterminadora do Chefe Malunguinho”, que após inúmeras investidas, conseguiu detê-lo e exterminá-lo em 1829.

O Catucá não se calou e sua luta por liberdade continuou com outros diversos líderes “Malunguinhos”, entre eles, o João Batista, último líder do quilombo, dominando importante quartel general chamado Cova da Onça e fazendo frente de guerra nas matas da antiga Maricota, hoje Abreu e Lima. Afamado pela sua coragem, João Batista foi amplamente perseguido, tendo sido assassinado de forma covarde em emboscada cruel em setembro de 1837, como informou documento expedido no dia 18 do mesmo mês.

A longa história do Catucá e dos Malunguinhos é grande e importante para o país. Continuando viva até os dias de hoje.

Malunguinho foi deificado e transformou-se numa das mais importantes divindades da Jurema Sagrada, coisa inédita a acontecer com outras lideranças negras no paísl. Ele virou um espírito de grande poder nessa religião do nosso Nordeste. Malunguinho é caboclo (índio), mestre, trunqueior/exu e Reis, titularidades religiosas dentro destra tradição forte e em pleno funcionamento em todo Pernambuco. Ele é o primeiro a ser cultuado, a receber oferendas e continuando sua missão como defensor do povo negríndio e pobre, é dada a ela a missão de defender a casa de todos os males, protegendo o portão do terreiro e as Cidades encantadas da Jurema. Seu papel continua sendo essencial para todas e todos que nele tem fé. Realizador de grandes milagres, é muito querido pelos juremeiros e juremeiras.

É em Abreu e Lima que acontece o maior encontro do povo de terreiro do Estado, o Kipupa Malunguinho – Coco na Mata do Catucá (@kipupamalunguinho), evento realizado pela instituição Quilombo Cultural Malunguinho (@qcmalunguinho) que há 15 anos faz esse grande e importante evento que atrai pessoas de todo país para conhecer as matas de Pitanga II, onde outrora Malunguinho e seus bandos dominaram e fizeram a mais importante revolução negra que a história conheceu depois de Palmares.

O Estado de Pernambuco aprovou a Lei Estadual da Vivência e Prática da Cultura Afro Pernambucana, a Lei Malunguinho nº 13.298/07, revogada e relocada na lei 16.241/17), que instituiu no calendário anual uma semana para debater a importância de Malunguinho para nossa identidade. Outras leis com o mesmo propósito foram aprovadas em São Lourenço da Mata (2.285/09), Olinda (5591/17) e Recife (18.562/19), faltando a Cidade de Abreu e Lima se pronunciar e aprovar uma lei ampla no município que valorize sua história a partir de Malunguinho e toda luta negríndia que envolve essa temática.

Malunguinho vive! O Catucá vive! Sobô Nirê Mafá!


Texto: Alexandre L’Omi L’Odò – juremeiro, historiador e mestre em ciências das religiões – SIGA: @alexandrelomilodo

Alexandre L'Omi L'Odò

Quilombo Cultural Malunguinho

alexandrelomilodo@gmail.com

segunda-feira, 28 de junho de 2021

Juninho do Coco é a continuidade da tradição do coco do Quilombo Urbano do Amaro Branco (live)

 

Juninho do Coco lança seu primeiro CD, "Meu Axé". Foto de Monique Silva.

Juninho do Coco é a continuidade da tradição do coco do quilombo urbano do Amaro Branco (live)

Ele nasceu com o trovão no coração. Bate o bombo e faz a festa acontecer.

Juninho do Coco (@juninhodococo) lança seu primeiro CD trazendo seu amor ao coco praieiro para o público. Sempre tocou para inúmeros mestres e mestras como a Mestra Ana Lúcia do Coco, @aurinhadococooficial, @mestregalo, Selma do Coco, @donaglorinhadococooficial, @zecadorolete, entre tantos outros artistas da cena da cultura popular.

Agora chegou a hora de ocupar o microfone principal e mostrar todo seu talento de compositor, percussionista e cantor. Ele sempre protagonizou sua história, e com a força da Jurema vem mostrar toda herança familiar do coco que tem.

Juninho é a continuidade do coco do Quilombo urbano do Amaro Branco. Traz a cultura negríndia no sangue e sabe mostrar seu valor. O baque é forte e a pisada é profunda. Com ele o patrimônio cultural de seus ancestrais está salvaguardado.

Live de lançamento 29 de junho

20h

Canal de YouTube de: @alexandrelomilodo

Fotos de @monie.ft @moniquedzsilva


Fotos de divulgação do lançamento do CD "Meu Axé":

Todas fotografias de Monique Silva.

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Alexandre L’Omi L’Odò

Produção fonográfica e direção artística

alexandrelomilodo@gmail.com

Quilombo Cultural Malunguinho

Quilombo Cultural Malunguinho
Entidade cultural da resistência negra pernambucana, luta e educação através da religião negra e indígena e da cultura afro-brasileira!