Oxum
Padroeira da cidade de Camaragibe - PE
Uma questão de luta para a preservação dos mananciais e do ecossistema!
Materializando em forma de passeata pública, da Avenida Doutor Belmínio Correia até a Queda D'água, na Vila da Fábrica, numa cachoeira de acesso arriscado, levando a Cesta da Oxum, acompanhados pelo Afoxé Iyámi Balé Jilé, da Mameto Balé Jiná, a Mãe Nadja de Angola, do bairro do Ibura, no Recife, os sacerdotes e sacerdotisas, iniciados, neófitos e admiradores das diversas manifestações afro indígenas religiosas, além de representações políticas e governamentais, levaram ao conhecimento geral do povo da cidade a informação de que o Orixá Oxum, havia se tornado padroeira da cidade, por motivos de ideologia e preocupação ecológica, pois Oxum, sendo o Orixá dos rios e das águas doces, foi eleita pelo coletivo de sacerdotes e sacerdotisas do município, como ícone da preservação dos rios e mananciais da cidade após vasta consulta ao Ifá (jogo de búzios) e a diálogos com povo de terreiro da localidade.
A cidade, cortada pelo Rio Capibaribe, e tendo diversos mananciais, além de cachoeiras, sofre forte processo de poluição por parte de fábricas, lixo das comunidades e a total falta de políticas públicas de preservação do ecossistema local, fato este, que coloca o povo de terreiro em situação crítica de preocupação, pois sem água no há axé, sem água não há vida, sem rio, Oxum, a dona da fertilidade humana, da gravidez, das crianças e gestação e, da fertilidade da terra, morre, some, é afastada de seu domínio mítico teológico natural. Pensando em reverter este processo de autodestruição coletiva, os babalorixás, iyálorixás, juremeiros e juremeiras, e todos das religiões afro indígenas, inteligentemente resolveram criar atividades que trouxessem esta realidade à consciência coletiva do povo e dos poderes públicos, provocando assim uma discussão maior sobre o tema.
Mesmo com sérias dificuldades de comunicação e articulação com o poder público local, que não atendeu às reivindicações oficiais dos sacerdotes e sacerdotisas, como segundo o Pai Gilmar de Ògún, um dos organizadores e coordenadores do evento informou, foram enviados 5 ofícios solicitando apoio ao evento, como carro de som bom, trio elétrico e estrutura de logística e segurança para a caminhada, mas em quase nada foram atendidos, pois o carro de som foi de péssima qualidade, atrapalhando o melhor desenvolvimento das atividades e falas, além da pouca segurança e a falta até de água para os participantes beber. Isso mostra o retrato real de uma gestão não preocupada com temas de tão profunda urgência e importância. Os organizadores, acreditam inda que como o evento foi realizado e organizado por pessoas de terreiros, na maioria negros e negras de candomblé, a dificuldade foi maior, pois sabe-se da forte influência evangélica dentro dos órgãos da prefeitura. Contando com o apoio da Fundação de Cultura de Camaragibe, na pessoa de Rejane, o evento aconteceu na força coletiva do axé, força que rege o povo de terreiro, energia que transcende as dificuldades e nos ajuda junto com Exú, a realizar todas as coisas.
Alexandre L'Omi L'Odò falando sobre a importância do povo de terreiro se organizar e compreender sua história, para se defender da satanização da religião pelos evangélicos.
A convite dos organizadores do evento, os representantes da Pesquisa Socioeconômica e Cultural dos Povos de Matrizes Africanas, do MDS- Ministério do Desenvolvimento Social, UNESCO e Fundação Palmares, o Rafael Barros de MG da Filmes de Quintal, coordenador da pesquisa em Pernambuco, os pesquisadores, João Vitor, Alex Nagô e Alexandre L'Omi L'Odò, participaram ativamente do evento, com direito a fala no local.
Com muita fé e presença de lideranças antigas dos terreiros da cidade como o Pai Djair de Oyá, que com um discurso muito bem fundamentado na afrocentricidade e na consciência negro religiosa, colocou em ordem o pensamento dos presentes, discursando de forma inflamada e cheia de força, reivindicando os direitos à natureza e a liberdade religiosa para o povo de terreiro que sofre todos os dias o racismo e a intolerância. Mãe Graça de Xangô, representante da Umbanda, falou e fez em forma de repente seu discurso defendendo nossa liberdade. Outras lideranças se manifestaram e o Iyawò Alexandre L'Omi L'Odò, tomou a fala a convite dos organizadores e falou do conceito de satanização que as igrejas neopentecostais cotidianamente vem tentando de forma agressiva e criminosa estigmatizar os terreiros e suas práticas. A fala foi muito forte e provocou manifestação de evangélicos que de longe assistiam ao evento. Dentre eles, um que com a Bíblia na mão, veio até o L'Omi e disse que a bíblia prova em um versículo que não recordo que Jesus diz que somos demônios por praticarmos a religião dos negros. esta situação de intolerância religiosa pública, gerou revolta em todos presentes, que juntaram-se e quase tomam medidas agressivas contra o intolerante racista que logo sumiu do local correndo como um covarde. L'Omi, assumiu mais uma vez a fala e colocou ordem na situação que mostrou de forma prática como se dá a satanização da religião negro indígena.
Passado o fato inusitado, o corpo de sacerdotes se reuniu entorno da Cesta de Oxum, feita e decorada pelo Babalorixá Djair de Oyá, e a celebração à Oxum iniciou com muita força e visível alegria dos presentes pela vitória de no hoje poder manifestar sua fé nas ruas, sem que a polícia venha agredir e reprimir.
Mãe Graça de Xangô, discursando sobre a importância ed Oxum.
Oxum se fez presente, atendendo o chamado de todos. A chuva que levemente caiu nas cabeças dos sacerdotes, prova da aceitação da homenagem à ela. A vibração foi muito forte sobre o cântico:
"Mo r'ómi màá jó- Vejo água, danço
Mo r'ómi màá 'yò- Vejo água, sou feliz
àgbàdo mi l'ore òjò- O meu milho é amigo da chuva"*
A discussão sobre o tema pretende seguir com a realização de outros eventos. Oxum sempre encabeçando as discussões, como centro ético da preservação da natureza e das águas doces. Pai Gilmar de Ògún registra em entrevista por telefone que a luta continuará devido a importância que o rio tem para o povo de terreiro, conseqüentemente a todo ser vivo.
Veja o vídeo deste momento:
Alexandre L'Omi L'Odò.
Iyawò de Osún.
alexandrelomilodo@gmail.com
*Oriki extraído da bibliografia: CARVALHO, José Jorge de. Cantos Sagrados do Xangô do Recife. Brasília: Fundação Cultural Palmares. 1993. pag. 96 e 97.
**Saudação à Oxum. Extraída da bibliografia: Beniste, José.As águas de Oxalá: (àwon omi Ósàlá). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. Pág. 127.
--> Agradeço ao Pai Gilmar de Ògún pela entrevista dada a mim por telefone e, por ter repassado informações que contribuíram muito para este texto/relatório.
--> Agradeço à João Vitor que dês do primeiro momento me ajudou tmabém com informações sobre o evento, tendo sido ele o pesquisador que me convidou junto com o Rafael Barros para ir ao evento.
--> As fotos são de autorias diversas. Os autores: Alexandre L'Omi L'Odò, João Vitor e Rafael Barros. O Vídeo foi filmado por Rafael Barros.
--> Mesmo tendo passado tanto tempo depois do evento, só hoje Oxum me deu condições de escrever sobre este evento que ao meu ver foi historico e merece ser copiado em outras cidades.
3 comentários:
Lindo! Maravilhoso! Camaragibe deve abrir espaço para esse tipo de manifestação sempre. Fico muito feliz em ver movimentos assim, na praça, escancarados,rompendo preconceitos e chamando o povo para compreender a religião do outro. Parabéns aos idealizadores. ;)
Camaragibe é do Senhor Jesus e não de santo nenhum, afinal quem fez tudo, céus, terra, água, mar, árvores etc. foi DEUS. Á Ele toda honra e toda glória seja dada.
Camaragibe é do SENHOR JESUS, é ELE o protetor de todos os homens de todas as cidades, afinal tudo foi feito por DEUS e não por oxum. Só DEUS merece toda honra e toda a glória. Tudo seja louvado ao nome do SENHOR DEUS.
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