sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Povo de Terreiro não Pratica Sacrifícios Humanos!

Digitalização de parte da matéria do Jornal do Commercio de 12/07/2012, Cadernos Cidades, p. 3. Título da reportagem: "Morte em ritual macabro e cruel". Fala de Alexandre L'Omi L'Odò. Acervo.
 
O Povo de Terreiro não Pratica Sacrifícios Humanos!

Nós, Povos Tradicionais de Terreiro, integrantes da Jurema Sagrada, do Candomblé, da Umbanda, do Terecô, do Batuque, do Tambor de Mina Jeje e Nagô, do Xangô Pernambucano, da Kimbanda, Rezadeiras, Oradores do Nordeste, Catimbozeiros, Pajés, não praticamos sacrifícios humanos em nossas liturgias e rituais. Nossas teologias não concebem a morte humana como caminho para alcançar qualquer benefício na vida e, desconhecemos qualquer ritual pertinente a esta prática condenável.  Expugnamos completamente estes atos absurdos de assassinato em nome de qualquer Deus, deus, religião ou prática ritualística de seitas. Somos contra estas psicopatias cruéis e não aceitamos as acusações que nos direcionam a polícia e a mídia Pernambucana (escrita e televisiva) no caso do menino (Fânio da Silva Macedo) de 9 anos de idade assassinado e degolado cruelmente no Brejo da Madre de Deus/PE, e em tantos outros.

Nossas religiões prezam pela vida, pela saúde, pelo bem estar, pelo desenvolvimento social e sempre esta presente onde o Estado não chega, garantindo também alimentação aos que por ventura não tenham... Os terreiros são templos religiosos de matrizes africanas e indígenas que recebem milhares de pessoas todos os dias para promover a ajuda e aliviar os desesperados. Respeitamos a vida e a natureza, respeitamos o universo e todos os elementos que o materializa, portanto, a prática de assassinato de um ser humano para oferendas  é completamente impossível acontecer em nossas concepções teológicas e práticas religiosas.

Não praticamos "magia negra", desconhecemos estas práticas de origem européia. Nossas divindades e entidades em nada tem haver com a forma ritual destes povos.  Também não cultuamos demônios, diabos ou o satanás. Esta divindade cristã sequer são conhecidas pela nossa teologia que não faz menção aos textos bíblicos e consequentemente ao imaginário maniqueísta do céu e do inferno. Somos outra cultura, de outros povos, com outra formação. Mesmo ainda vivenciando os resquícios do sincretismo religioso com o catolicismo, e utilizando alguns termos cristãos, não praticamos nem acreditamos nestas divindades.

Queremos que a mídia tome uma postura adequada, e sobre tudo informativa/educativa, com conteúdo consistente, não racista e preconceituoso  em relação as nossas religiões! Os terreiros destruídos no Brejo da Madre de Deus são o resultado concreto de um sistema de má informação à população através destes meios de mídia que deram uma conotação completamente errada ao contextualizar os assassinos do garoto como pais de santo. O próprio termo "pai de santo" não é utilizado mais por nós, povos de terreiro. Este termo caiu em desuso sendo substituído pelos termos originais: babalorixá (para designar o sacerdote masculino) e iyalorixá (para designar a sacerdotisa feminina), ou ainda juremeiro e juremeira para os sacerdotes do culto da Jurema Sagrada.

Ressaltamos que o babalorixá ou iyalorixá, ou o juremeiro e a juremeira, são sacerdotes e sacerdotisas que passam por uma formação extremamente rígida de 7 e 14 anos estudando e vivenciando os conhecimentos africanos e indígenas para poder professar e presidir as práticas religiosas e poder ter um terreiro aberto. Muitos psicopatas se passam por estes religiosos e de forma irresponsável abrem terreiro e enganam as pessoas necessitadas de orientação, pessoas que estão fragilizadas por seus problemas e necessidades. Portanto, a mídia deve se preocupar sim em averiguar e pesquisar as pessoas de quem eles estão falando, averiguar a história deles e conferir com o povo de terreiro sério, quem são estes supostos "pais de santo", não apenas publicar de forma inresponsável que estes cruéis pertencem a nossa religião. Este foi um erro grave da mídia e da polícia, que acarretou em um crime histórico contra as comunidades tradicionais de terreiro do Brejo da Madre de Deus e consequentemente de todo Brasil. Este fato foi um dano moral coletivo cometido contra todos nós pertencentes as religiões de matrizes africanas e indígenas! Isso deve ser reparado urgentemente com indenizações às casas destruídas, prisão dos vândalos envolvidos e punição e retratação pública e explícita da mídia e da polícia. O Estado brasileiro tem que nos dar esta resposta o quanto antes, ou nós todos, de todo Brasil, entraremos com uma ação de dano moral coletiva no STF. Vamos nos organizar, relatar, registrar todo o fato para termos mais argumentos a nosso favor. Mas o que foi feito não se apaga. Portanto, vamos juntar o que resta de nós e prosseguir firmes nessa luta por respeito!

Exigimos Respeito!!

Cataloguei todos os 14 programas exibidos na mídia pernambucana desde o dia 10/07, quando iniciou este processo. Na segunda feira dia 16/07, será exibida uma entrevista realizada a partir de nossa atitude de solicitar ao programa um resposta ao povo. Fomos ao Ilé Iyemojá Ògúnté, casa de tradição nagô junto a Mãe Lu de Iyemojá Ògúnté, Bárbara Costa e Sandro de Jucá contribuir na defesa do Povo de Terreiro. Para acompanhar o caso e entender a questão com maiores detalhes, vejam os vídeos exibidos na televisão pernambucana (em ordem de exibição do primeiro ao último) através do programa de Cardinot:














 

Alexandre L'Omi L'Odò
Quilombo Cultural Malunguinho
alexandrelomilodo@gmail.com

Um comentário:

Maria Souza (ateliê afetivo) disse...

querido, ótimo texto! conheci seu blog agora e achei muito ótimo! sugiro que vc fale sobre como uma pessoa pode conhecer de perto as religiões afro. Por exemplo, eu tenho muita curiosidade e até uma necessidade pessoal de conhecer, saber qual meu orixá, senti a energia... mas não sei como. eu e muita gente que conheço...as pessoas sabem que dia domingo tem missa nas igrejas católicas e como é nas religiões afro e indigena? entende? é triste a ignorância... então sugiro uma postagem com esse tema. pode ser?

Quilombo Cultural Malunguinho

Quilombo Cultural Malunguinho
Entidade cultural da resistência negra pernambucana, luta e educação através da religião negra e indígena e da cultura afro-brasileira!