sábado, 15 de agosto de 2009

Candomblé de SP é tombado como Patrimônio Imaterial do Estado.

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Republico aqui a matéria postada em 21 de Julho de 2009, no site Meu Lote, do grande companheiro Nei Lopes, que trata da sanção da lei estadual que tombou o Candomblé do estado de São Paulo como patrimônio imaterial do Estado, ação protagonizada pelo Deputado estadual
Gilberto Palmares, que foi sancionada por Luiz Fernando Pezão, Governador em exercício.
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CANDOMBLÉS EM FESTA!
PALMARES PROPÕE E PEZÃO SANCIONA LEI DE TOMBAMENTO

A denominação “candomblé” é o termo genérico com que, no Brasil, a partir da Bahia e desde o início do século 19, se designa o culto aos orixás jeje-nagôs (iorubanos e daomeanos, oriundos da região corresponde ao sudoeste da Nigéria e sudeste do Benin) bem como algumas formas dele derivadas, manifestas em diversas “nações”. Por extensão, o nome designa também a celebração, a festa dessa tradição; e a comunidade onde se realizam essas festas. Ex: “Hoje tem ‘candomblé’ no Candomblé de F.”

A modalidade original do candomblé consiste em um sistema religioso autônomo e específico que ganhou forma e se desenvolveu no Brasil, a partir da Bahia, com base em diversas tradições religiosas de origem africana, notadamente da região do Golfo da Guiné. Já os candomblés bantos, de rito “congo” ou “angola” e como tal referidos (“o congo”; “o angola”), são modalidades de culto nos quais prevalece a utilização de linguagem crioulizada originária respectivamente do quicongo e do quimbundo, línguas do grupo banto, faladas no Congo e em Angola. Estruturalmente, os símbolos e práticas desses candomblés pouco diferem daqueles usados nos candomblés de matriz nagô ou iorubana; e, recentemente, alguns estudos vêm desvendando aproximações suas com o universo dos antigos terreiros jejes. Entretanto, as similaridades desses candomblés com outras expressões da religiosidade banta, no Brasil e nas Américas, apenas são perceptíveis, pelo menos aparentemente, no âmbito da linguagem.

Outras modalidades de culto, como o batuque gaúcho, o xangô pernambucano, a mina maranhense, a umbanda etc., são caudatárias da matriz jeje-nagô, porém muitas vezes entrecruzada, essa matriz, com substratos bantos. Nesse particular, veja-se que a própria denominação “candomblé” (da mesma extração de "candombe") parece ter como étimo o termo multilingüístico banto kiandombe ou ndombe, significando “negro”.

Vejamos agora que o protótipo da espécie de comunidade religiosa hoje conhecida como “candomblé” foi o chamado “Candomblé da Barroquinha”, casa de culto implantada em Salvador, Bahia, no bairro central que lhe empresta o nome, por volta de 1789. Antepassado do atual Ilê Axé Iyá Nassô Oká, conhecido como “Casa Branca do Engenho Velho da Federação” ou simplesmente “Casa Branca”, esse terreiro foi fundado no momento histórico em que se verificavam os primeiros ataques daomeanos ao Reino de Queto (Ketu) – quando foram feitos cerca de 2000 cativos – e com o desembarque maciço na Bahia dos primeiros escravos dessa região.

Segundo a tradição oral, antes de seu efetivo estabelecimento, os futuros fundadores tinham-se aproximado dos cultos mantidos por africanos de nação Grunce ou Grunci, no bairro da Boa Viagem, na localidade de Dendezeiros, atual Vila Militar. Suas origens físicas remontam a uma casa, na Ladeira do Berquó ou na Rua da Lama, ambas hoje denominadas “Visconde de Itaparica”, erguida em terreno arrendado a um casal de proprietários brancos filiado à Confraria de Nossa Senhora da Piedade da Igreja da Barroquinha, fundada por crioulos e africanos da Costa da Mina em 1764.

Em seu magnífico trabalho sobre as origens do terreiro, o historiador baiano Renato da Silveira (O candomblé da Barroquinha: processo de constituição do primeiro terreiro baiano de queto. Salvador, Edições Maianga, 2006) conclui, com relativa certeza o seguinte: que, por volta de 1789 membros da família Arô, da linhagem real de Queto, e aliados, instituíram, nas cercanias da Igreja da Barroquinha, um culto doméstico a Odé Oni Popô (uma das manifestações de Oxossi) e, logo depois, também a Airá Intilê (um avatar de Xangô). Firmou-se, então, um acordo político ou aliança, que fez surgir o modelo de candomblé até hoje vigente, o qual, em vez de ser local de culto a uma só divindade, como o “calundu” colonial, concentra vários cultos a divindades de procedências diversas. Entretanto, por volta de 1807, após o arrendamento de um terreno situado atrás da igrejinha, por divergência de idéias, esse grupo transferiu-se para a localidade suburbana de Matatu de Brotas, onde, além dos orixás já cultuados, assentou também os fundamentos de Oxumarê, permanecendo os fiéis da Barroquinha devotados, ao que parece, principalmente ao culto de Airá Intilê. O terreiro suburbano deu origem ao conhecido Candomblé do Alaqueto e o do centro, à atual Casa Branca, mais tarde transferida para a localidade do Engenho Velho.

Vejamos finalmente que, desde pelo menos a década de 1870, por diversas razões históricas, o intercâmbio entre as comunidades negras na Bahia e no Rio de Janeiro foi intenso, dele nascendo, quase ao mesmo tempo, algumas importantes casas de culto em Salvador e na “Pequena África” carioca (eixo Praça Onze-Praça Mauá atuais), como foi o caso do venerando Ilê Axé Opô Afonjá e de outros axés históricos, como o de João Alabá.

Diante de toda essa monumental história, nada mais gratificante, então, que ler nos jornais cariocas deste fim de semana, que a lei de tombamento da religião do candomblé como patrimônio imaterial do Estado, proposta por nosso deputado e amigo Gilberto Palmares acaba de ser sancionada por Luiz Fernando Pezão, governador em exercício. E isto, no momento em que, por baixo do imenso caldeirão onde borbulha o mungunzá (denguê, pro povo nagô), vem crescendo uma revolução silenciosa, comandada por Ifá, o orixá do saber e da inteligência, retornado ao Brasil em 1991, depois de um longo exílio.

Mas isso é uma outra história.


*Fonte: blog meu Lote (www.neilopes.blogger.com.br).
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sentindo-me insitado à contribuir no campo da legitimação oficial das tradições que vivencio e pratico (Jurema Sagrada e Xangô) em meu Estado, àpartir da leitura desta notícia brilhante, que iluminou mais ainda meu pensamento, proponho a Pernambuco e a seus movimentos religiosos, instigar a realização do mesmo ato protagonizado pelo Deputado estadual Gilberto Palmares em sua assembléia, aqui. Vamos Tornar a Jurema Sagrada patrimônio de Pernambuco, assim como nossa Nação Nagô pernambucana/recifense.

*{Observação sobre o texto: Todo discurso sobre o retorno do ifá em 1991, sitado por Nei, casou-me desconforto. Sabendo que Ifá sempre teve seu lugar extremamente preservado dentro do Culto Nagô pernambucano, como poderia orunmilá ter saído do Brasil assim tão ilogicamente? Ifá está em Pernambuco, podem vir ver!}*.

Alexandre L'Omi L'odò
Quilombo cultural Malunguinho
174 Anos Resitindo!
alexandrelomilodo@gmail.com

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